sábado, 26 de abril de 2008

Nova Lei e Lucros Acumulados

Antônio Lopes de Sá

A exclusão dos “Lucros Acumulados” do grupo do Patrimônio Líquido, segundo a lei 11.638/07 que modificou a das sociedades por ações criou algo fora da realidade.

Como em Contabilidade cada conta possui uma função específica torna-se falso atribuir a um valor de “lucro ainda não destinado” qualquer das classificações que a Lei determina.

O texto legal refere-se apenas a capital social, reservas de capital, ajustes de avaliação patrimonial, reservas de lucros, ações em tesouraria e prejuízos acumulados.

Considera os prejuízos acumulados (logo o sem destinação), mas não segue o mesmo critério em relação aos lucros, adotando, pois, dois pesos e duas medidas para um mesmo fato, ou seja, o do resultado sem destinação.

Diante do fato consumado pela legislação, o profissional deixa de ter alternativa posto que nenhum dos itens relacionados como partes do Patrimônio Líquido equivale ao que habitualmente se praticava e que era deixar a definição da distribuição para o futuro.

Infere-se que o compulsoriamente estabelecido determina a destinação, e, nesse caso, só uma opção restaria: a de “Reserva de Lucro” (denominação genérica dada pela lei).

Doutrinariamente, entretanto, a Reserva é algo específico que envolve um fato diferente daquele relativo a simples “acumulação”.

Uma coisa é “deixar um lucro para ver o que se fará com o mesmo” e outra é “atribuir a responsabilidade de uma destinação”.

É quanto a esse particular que o problema se estabelece, ou seja, quanto à exclusão da liberdade de “não destinar”.

A Reserva, única opção que resta, é algo obrigatório quanto à destinação e esta não tem o caráter técnico do amplo livre-arbítrio no que tange ao destino.

O poder da Assembléia de Acionistas em destinar ficou tolhido porque este envolvia inclusive o de “deixar em suspenso os resultados”.

Nesse particular a norma contábil inserida na lei tornou-se maior que o próprio espírito da lei em dar poder amplo aos acionistas.

Ou seja, a assembléia geral de acionistas tudo pode fazer com os lucros, menos deixar de totalmente destiná-los livremente (porque se tolhe o direito de deixar sem destinação face à nova lei); logo, por paradoxal que pareça aquela não tem pleno poder quanto ao destino de seu capital próprio (porque lucros nestes se inserem).

O artigo 121 da Lei 6404/76 cujo texto de forma hialina estabelece que: “A assembléia-geral, convocada e instalada de acordo com a lei e o estatuto, tem poderes para decidir todos os negócios relativos ao objeto da companhia e tomar as resoluções que julgar convenientes à sua defesa e desenvolvimento” perde vigor, sem dúvida, diante da lei 11.638/07 no que esta disciplina sobre o Patrimônio Líquido.

Se a Assembléia julgar conveniente que os lucros fiquem acumulados e pode fazê-lo segundo o artigo citado, ficará, todavia impedida de fielmente informar que isso é Patrimônio Líquido.

Mesmo podendo ter ação sobre as Demonstrações Contábeis face a Lei 10.303/01 que dá ao órgão o poder de tomar, anualmente, as contas dos administradores e deliberar sobre as demonstrações financeiras por eles apresentadas, ficará impedida de denunciar com fidelidade técnica os lucros em suspenso ou acumulados.

A questão, portanto, ainda trará sérios problemas evidenciando que mesmo através de remendos, resoluções, expedientes, normas, pronunciamentos - seja o que for - se permanecer o erro da lei 11.638/07 (que considera perda, mas não considera lucro acumulado) a expressão analítica do patrimônio Líquido continuará sendo informada falsamente.

domingo, 20 de abril de 2008

Responsabilidade profissional e falácias em normas internacionais de contabilidade

Antônio Lopes de Sá


A responsabilidade do profissional em emitir opinião para nortear a terceiros sobre situações patrimoniais envolve responsabilidade ética.

A dependência de outras pessoas em relação ao que venha a orientar um contabilista é notória não sendo permitido errar ou falsear sem prejudicar a quem solicita um parecer.

Isso significa que quer individual ou socialmente sérias questões decorrem quando existem opiniões de má qualidade.

No campo pericial, em auditoria, na gestão das empresas, a opinião enganosa pode causar danos de todas as dimensões e naturezas.

O Código Civil de 2002 vem de responsabilizar o preposto, como é o Contador, não só perante o preponente, mas, também, perante terceiros e nesse caso se enquadra o profissional da Contabilidade.

Tal situação alterou o procedimento anterior e aumentou consideravelmente o ônus que recaia sobre a função contábil e que é a de cumprir tarefas determinadas por alguém.

A obediência, pois, aos preceitos doutrinários da ciência, metodologia adequada e sadia é algo que multiplicou sua importância.

Hoje mais que nunca se faz necessário a adoção de rigorosos critérios para que as conclusões sejam adequadas.

A quebra do valor ético aumenta a necessidade de uma invulgar atenção sobre todos os fatos submetidos ao exame profissional.

Na medida em que se consagra a mentira como algo aceitável, em que falta o respeito ao patrimônio alheio e especialmente ao público, o profissional da Contabilidade precisa redobrar as suas atenções a fim de que não seja vítima de tal deteriorado processo.

Tem havido, todavia, uma vocação irresponsável de culpar-se o contabilista pelos erros cometidos por gestores de riquezas, assim como conluios têm-se realizados para lesar patrimonialmente a terceiros imputando-se depois a culpa aos profissionais.

As levianas atitudes dos que assim acusam tem aumentado o risco no exercício profissional de forma assustadora.

O importante, pois, é que além de rigorosamente atualizar-se o contabilista tenha em mente não se contentar em ter conhecimento, sendo necessárias cautela e estratégia para evitar riscos de acusações em razão das tarefas que desempenha.

Por outro lado deve redobrar suas atenções de forma a não ser omisso ou negligente em opinar, considerados males que podem causar as opiniões derivadas de incompetência, má fé ou omissão.

O risco, todavia, aumentou, sensivelmente, após a edição da Lei 11.638/07 que apóia as ditas normas internacionais, estas que são portas abertas ao subjetivo tal como se apresentam na atualidade.

Várias falhas se consagram com tal abertura.

Assim, por exemplo, o denominado “valor justo” é uma inequívoca sinalização a uma expressão que pode resultar em falsidade se não houver um freio à excessiva liberalidade que enseja.

As Normas Internacionais dão com isso asas à arbitrariedade, fugindo ao rigor científico.

Diversos são os equívocos de um mal elaborado sistema que se apresentando como “nova visão contábil” e a título de “convergência” (o que é igualmente discutível) está a incorrer em sérios defeitos conceituais.

Dentre as várias lacunas existe ainda a imposição normativa de considerar o Arrendamento Mercantil (Leasing) como Imobilizado o que vai falsear a opinião nas empresas, obrigando o profissional a mentir e evidenciar erroneamente a quem busca a informação.

A falta de lógica que existe em muitas das “definições”, a visão equivocada da realidade, o afastamento da ciência, tudo isso mais cedo ou mais tarde redundará em novos problemas nos mercados de capitais, em defluência das informações enganosas que as ditas Normas Internacionais ensejam.

O tempo se incumbirá de provar o quanto de equivocado existe nessa submissão cultural agasalhada pela lei e que agora tanto preocupa pelos sérios defeitos de base que apresenta.

Entre o que estabelece o Código Civil de 2002 e as Leis das Sociedades por Ações existem inequívocos riscos a serem ponderados.

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Visão dinâmica e contabilidade

Antônio Lopes de Sá



Os imensos recursos que hoje oferecem as doutrinas da Contabilidade permitem uma visão competente para orientar administrações, investidores, autoridades fiscais e judiciárias, em suma, tantos quantos necessitem entender sobre a “dinâmica dos capitais”.


Tal foi o progresso ocorrido que é impossível a quem não possua uma formação cultural específica interpretar a linguagem das demonstrações contábeis e até mesmo entender o que ela possa oferecer como recurso intelectual.


A visão antiga de que apenas guardar memória dos fatos e comprová-los era o bastante, ficou já há bastante tempo superada no tempo.


Entender o que se memoriza, reconhecer que existem fenômenos específicos a serem estudados relativos ao movimento do patrimônio, foi uma percepção que há mais de dois milênios e meio já estava despertada no oriente e entre pensadores da antiga Grécia.


Afirmou o grande pensador Aristóteles (384 a.C. - 322 a.C.) que havia uma ciência que cuidava da riqueza dos indivíduos e que essa não era a Economia, mas, sim um conhecimento distinto (obra “A Política”).


Na antiga Índia, Kautylia em seu famoso “Arthasastra” (300 a.C.) já evidenciava conhecimentos da área contábil e os tratava como algo específico.


Consultores contábeis, ao longo do tempo manifestaram suas opiniões e foi um deles, famoso em sua época, o precursor da construção de uma disciplinada forma de entender os registros.


Refiro-me a Ângelo Pietra que em 1586 empreendeu o passo decisivo para a edificação científica da Contabilidade, produzindo conceitos básicos.


A partir das formações conceituais surgiram as Teorias, inicialmente de natureza limitada à “forma”, mas, depois, no século XIX, objetivando a “essência”, ou seja, o “patrimônio”.


A partir dos estudos que se realizaram posteriormente (já nos fins do século XVIII) a Contabilidade foi finalmente consagrada como ciência (1836) pela mais famosa entidade intelectual do mundo de seu tempo, a Academia de Ciências da França (a mesma que dentre outras abrigou as teses de Lavoisier, pai a Química Moderna e Pasteur, pai da Microbiologia).


Há, pois, cerca de dois séculos que a Contabilidade foi reconhecida como conhecimento específico de ordem superior, competente para acompanhar a dinâmica da riqueza e interpretá-la com segurança.


Os estudos avançados do século XX elevaram todo o acervo do passado a um patamar expressivo e a mais moderna corrente científica, o Neopatrimonialismo Contábil, acolheu e produziu em sua doutrina um expressivo número de modelos de comportamento dinâmico da riqueza dos empreendimentos (sobre os mesmos sugiro consulta à minha obra “A Moderna Análise de Balanço ao Alcance de Todos”, Editora JURUÁ).


Os referidos modelos sustentam hoje o “Axioma” da “Prosperidade”, ou seja, o grande objetivo de tornar a riqueza útil de forma constante.


Tão específico tornou-se tal conhecimento que só especialistas com boa formação cultural conseguem exercê-lo em nível de análise, perícia, auditoria, custos, planejamento, controle e consultoria.


Nos países desenvolvidos e em muitos “emergentes” em suas economias, os Contadores são imprescindíveis no assessoramento dos negócios e da gestão, não apenas como “informantes”, mas, especialmente como “consultores”.


Em minha longa carreira profissional tive ocasião de presenciar sucesso e fracasso de empresas de acordo com a qualidade do conhecimento contábil a elas oferecido e por elas utilizado.


O mau uso do conhecimento especializado ou a ausência dele tem sido responsável por um sem número de fracassos nos empreendimentos; tal fato, entendo, responsabiliza duplamente – ao usuário e ao profissional.

Ou seja, os que deixam de recorrer aos especialistas e os especialistas que não sabem socorrer são, ambos, os grandes responsáveis pela maioria dos fracassos no mundo dos negócios.

domingo, 6 de abril de 2008

sexta-feira, 4 de abril de 2008

Neopatrimonialismo Contábil

Neopatrimonialismo Contábil
  1. Definição
  2. O que não é
  3. A origem
  4. Verdades Básicas Aceitas pelo Neopatrimonialismo
  5. Para estudo mais aprofundado, consulte também


Definição

O Neopatrimonialismo Contábil é uma corrente doutrinária científica que tem por objeto, o estudo do Patrimônio dos empreendimentos humanos sob a finalidade da Prosperidade destes.

Tem como alicerce de doutrina a Teoria Geral do Conhecimento da Contabilidade.

Apóia-se em metodologia holística, ou seja, estuda os fenômenos da riqueza das células sociais (empresas e instituições) relacionados com os seus ambientes ou entornos.

O que não é

A doutrina Neopatrimonialista não é um procedimento de escrituração de acontecimentos, mas, sim que se vale de observações e registros contábeis para analisá-los e compreender as razões que motivaram os acontecimentos da riqueza.

Assim, ao analisar o lucro estuda o que influiu sobre este, não só dentro da empresa, mas, também em relação ao comportamento do mercado, política cambial, inflação, juros bancários, crises sociais etc. ou ainda, busca conhecer o fenômeno também em relação às “causas que motivaram o fato”.

A origem

O Neopatrimonialismo Contábil é um corpo de doutrinas que se formou no mundo latino e que se deriva por ampliação e avanço científico daquelas criadas pelos eméritos grandes mestres Giovanni Rossi, Fábio Besta, Vincenzo Masi, Alberto Ceccherelli (Itália), Jaime Lopes Amorim (Portugal) e Francisco D´Áuria (Brasil).

A estruturação da referida corrente intelectual, todavia, de acordo com os rigores da Epistemologia é de origem brasileira, sendo a primeira na História do Brasil a criar uma escola científica com milhares de adeptos em vários continentes do mundo.

Nasceu na década de 80 e se desenvolveu durante toda a mesma, alcançando apogeu na década de 90, sendo hoje a mais moderna e acolhida doutrina científica da atualidade, com expressivo número de publicações (artigos, dissertações, monografias, teses, livros, opúsculos).

Verdades Básicas Aceitas pelo Neopatrimonialismo

A doutrina Neopatrimonialista parte do princípio que o capital deve satisfazer as necessidades de um empreendimento humano para que ele seja sempre eficaz e possa crescer continuadamente (a isto denomina Prosperidade).

Reconhece que o patrimônio está sempre em mutação, ou seja, em constante transformação.

A partir de tais verdades básicas o Neopatrimonialismo Contábil constrói seus dois primeiros Axiomas: o Axioma do Movimento e o Axioma da Transformação.

Admite que o Capital não se mova por si mesmo, mas, sob a ação de forças externas a ele.

As indagações doutrinárias buscam, pois, nessa corrente de pensamento da Contabilidade, conhecer não apenas “o que aconteceu”, mas, sim, “porque aconteceu” o fato patrimonial.

Parte, pois, do pressuposto que: QUALQUER MOVIMENTO DA RIQUEZA IMPLICA TRANSFORMAÇÃO E QUE ESTA É CONSTANTE.

“Valor justo” e infidelidade informativa

Antônio Lopes de Sá
A insegurança trazida pelo conceito de “Valor Justo” está a causar contradições e ensejar alternativas.

Matéria veiculada no New York Times do dia 28 de março (If Market Prices Are Too Low, Ignore Them) bem mostra a vacilação e discutível conclusão da Comissão de Valores dos Estados Unidos, a SEC (e não é só ela que está em tal emaranhado).

Tudo porque se está esquecendo de que só a doutrina científica tem meios para salvar o movimento normativo (eivado de defeitos).

O assunto tem raízes profundas.

Há quase um século o emérito doutrinador italiano Fábio Besta, no tomo I de sua imortal obra “La Ragioneria” (obra identificada na Bibliografia, páginas 62, 83, 219 e seguintes, 259 e seguintes do Volume I), lecionou que as avaliações de maior segurança e menos sujeitas a dúvidas são as espelhadas pelo “valor nominal” dos elementos patrimoniais.

Fazendo o mestre a apologia da determinação monetária em bases confiáveis, fez-se também pioneiro quanto à construção de elementos que poderiam ser tidos como uma autêntica teorização sobre o tema.

Distinguiu, todavia, de forma clara, nas páginas referidas, a diferença entre “valor de contas” de “valor de troca da moeda”, fato que entendeu ensejar distorções, eventos que influem sobre a imagem da mensuração.

Defendeu de forma enfática uma adequação de valor, o mais próximo possível de uma realidade a ser medida.

Considerou o valor patrimonial como um complexo de elementos que contribuem para a formação do mesmo, mas, defendeu a unicidade de expressão; isso equivaleu a afirmar que se são apresentados diversos valores para uma coisa, ainda que para cada um se apresente justificativa, deixa-se de apresentar o valor real ou nominal.

Como coisas antigas reaparecem ciclicamente sob o manto de “novidades” as teses de Fábio Besta, sob novo rótulo, parecem ter sido evocadas pelas ditas Normas Internacionais sob a denominação de “Valor Justo”, mas sem sustentação competente para evitar a incerteza e abandonando em parte as sábias ponderações do iluminado mestre.

A simples referência a um poder de “efetivação real no mercado” como equivalente a de um “valor justo” é insuficiente e isto a realidade está a mostrar, conforme evidencia a matéria editada há pouco no New York Times, já referida (If Market Prices Are Too Low, Ignore Them).

Muitos são os defeitos a considerar.

Assim, por exemplo, um empreendimento não tem, normalmente, seu imobilizado para ser vendido, mas, sim, para ser usado, e, isto, em vez de “valorizar” o patrimônio por uma consideração de “valor de realização”, muito responsabiliza a empresa quanto ao “valor de reposição” ou de compra de novos equipamentos para manter “força produtiva” e a “capacidade competitiva”.

Em tese, o problema da aludida “reintegração da perda do capital pelo uso” desmerece o valor de realização de um bem do imobilizado, mesmo se considerados os aspectos do capital (qualitativo e quantitativo).

O preço da data do balanço, calculado para um bem, a valor de liquidação, poderá não ser mais o do dia seguinte e nem será possivelmente o de reposição da força produtiva, esta que exigirá desembolso de capital.

Esse o risco que hoje é assumido em defluência de uma “lei” que aceita uma submissão cultural relativa à informação contábil nas sociedades por ações (aferrada que ficou às Normas produzidas por grupos alienígenas).


BIBLIOGRAFIA

BESTA, Fábio - La Ragioneria, vols. I, II, III, edição Vallardi, Milão, 1929

FERREIRA, Leonor Fernandes – Modelos de avaliação de empresas e utilidade da informação contabilística – dissertação de doutorado em Gestão de Empresas, Universidade Lusíada, Lisboa, 2004

FERREIRA, Rogério Fernandes - A propósito das NIRF (Normas Internacionais de Relato Financeiro), em Revista de Contabilidade e Comércio, volume LX, nº. 239, Porto, Dezembro de 2007

NEW YORK TIMES, If Market Prices Are Too Low, Ignore Them, edição de 28 de março de 2008

SANTOS, Luís Lima – A Contabilidade nos paises de língua portuguesa, estudo comparativo dos normativos sobre demonstrações contabilisticas anuais para as empresas não financeira, edição da Faculdade de Ciências Econômicas e Empresariais de Vigo, Vigo, 2006

SIMÕES, Jorge Reis – As Normas Internacionais da Contabilidade do IASC à IASC Foundation, em Revista de Contabilidade e Comércio, volume LX, nº. 239, Porto, Dezembro de 2007

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Atribuição de valor e risco da volatilidade informativa

Antônio Lopes de Sá

A revista “CFO.com”, de New York, há dias divulgou, sob a responsabilidade de David Katz, matéria abordando o denominado “Valor Justo”.

Comentou que o movimento Normativo contábil não se ajustou ainda e que só em 2010 se espera uma solução para um conflito conceitual de base.

A mesma revista, todavia, tem artigos que evidenciam que os “Princípios Geralmente Aceitos” estão se despedindo para implantação do que se denomina como “IRFS”, mas que ainda não existe segurança nem um consenso firme (artigos de Rappeport e Johnson referidos na Bibliografia).

Entrementes, no Brasil, já consagrado pela Lei 11.638/07 e pelas Resoluções do Conselho Federal de Contabilidade o assunto é tido como pacífico, embora, na realidade, contestável e hibrido em certos aspectos como por exemplo quando na lei e normas se adotam como sinônimos (que não são), as nomenclaturas “Princípios Geralmente Aceitos”, “IRFSs” e “Normas Internacionais”.

Na realidade a “convergência” em tese, pelo que se tem noticiado, está ainda a gerar dúvidas e até conflitos entre os entendimentos das duas mais influentes entidades mundiais (IASB e FASB); permanece o referido sem uma definição inquestionável; deixa em sérias dúvidas e incertezas um dos temas de maior expressão e que é o do “Valor”.

Parece conservar esquecido que o conceito de “Valor” em Contabilidade, em si, na essência, fundamenta-se em uma atribuição de “qualidade”; ou seja, derivada da relação: “necessidade/utilidade”.

Embora a doutrina científica lecione que os bens patrimoniais, por natureza, existem para suprir as “necessidades” dos empreendimentos humanos, o tema vai sendo procrastinado e só se acenam soluções para 2010.

Parece anestesiado e entendimento de que são as necessidades as que emprestam as “qualidades” cujo caráter, face à “utilidade” enseja a atribuição de “valor”.

Na realidade coisa alguma vale por si mesmo, mas, sim, em função do que se lhe atribui de valor.

Uma coisa é valiosa pela proficuidade que representa.

Essa é em tese uma filosofia do “valor”, como tradicionalmente já era assim tida pelos pensadores estóicos há 2.000 anos, como foi sustentada pelos clássicos da Economia e da Contabilidade, mesmo sendo diferentes as metodologias nessas duas ciências.

O patrimônio, todavia, em sua essência, como objeto de estudos da Contabilidade, só se justifica como meio ou matéria proveitosa face à colimação de um escopo definido, requerendo observação “objetiva”.

É a “mensuração” do valor a que oferece o aspecto “quantitativo” à riqueza patrimonial.

Na essência o que se torna aleatório, pois, não é a atribuição de “qualidade”, mas, sim, a de “quantificação” ou “mensuração” desta.

Todavia, a determinação “quantitativa” subordinada à moeda (embora não sendo esta a exclusiva forma de avaliar) se por um lado permite a homogeneização do conjunto patrimonial, por outro se subordina aos efeitos dos tempos e dos espaços e isto é o que produz variações, porque se trata de “medida que também é medível”.

Essa a razão do mestre dos mestres, um dos mais famosos cientistas da Contabilidade do século XX, Gino Zappa, haver insistido em que “a noção de valor, quer da moeda, quer de toda mercadoria, implica sempre conceito de relatividade” (obra referida na Bibliografia, página 208).

O excelso tratadista com fundadas razões afirmou que a moeda não é medida absoluta de valor, mas, simplesmente a imagem deste em um dado momento (página 207 da obra referida na Bibliografia).

Destacou que o acessório segue o principal, ou ainda, que sendo a moeda instável, o valor que expressa se contamina por essa mesma relatividade e deixa de ser absoluto, ensejando riscos na mensuração.

Inúmeros autores modernos como dentre outros Baxter, da “London School of Economics”, também fundamentaram suas melhores obras partindo da mesma tese da “instabilidade da moeda” (Accounting Values and Inflation, identificada na Bibliografia, página 1 e seguintes), defendendo a necessidade de atualizações constantes.

Pacífica se tornou a consciência doutrinária sobre a debilidade do instrumento de medida utilizado em Contabilidade, recusando critérios “voláteis”, requerendo os estribados na ciência.

Importante, como substancial suporte de doutrina, foi o reconhecimento sobre a expressiva relação entre a “função das coisas” (utilidade) e a medida delas (valor), alertada nos fins do século XIX pelo ilustre expoente e precursor da Economia Aziendal Giovanni Rossi (obra identificada na Bibliografia), um dos precursores dos postulados que ensejaram uma “Teoria do Valor” sob o prisma contábil.

Os bens se mensuram, na essência, cientificamente, por influência “endógena”, pelo poder de “utilidade”, e, “exógena”, pelo que passivamente é impresso de mutação sobre a riqueza.

Tal tese magnificamente bem desenvolvida por Rossi foi também a que se tornou acolhida pela moderna doutrina como a de Baxter (obra identificada na Bibliografia).

Nas demonstrações, tradicionalmente adotadas, entretanto, a prevalência foi de há muito a do regime da “legalidade”, do “custo histórico”, mas, considerada a já referida instabilidade da moeda e dos fatores exógenos, a própria lei terminou por realizar concessões (admitindo correções e reavaliações).

Seja como for, entretanto, nenhuma tradução de valor escapou e nem escapa a instabilidade do instrumento preferencial de medida, este que nada tem de absoluto, que também se sujeita a medição.

É inequívoca, pois, a “relatividade do valor monetário” evidenciado, quer pela debilidade da moeda (que por si só já é mutável), quer pela eleição do método adotado na mensuração.

O que se deve buscar, pois, quanto ao tema, é reduzir ao máximo a “incerteza” que a mensuração possa trazer; contudo, quanto mais critérios se empregarem para avaliar sob óticas de interesses particulares e tanto mais incerto se tornará o demonstrado.

Quando se adota a multiplicidade de aspectos para a avaliação ao sabor de poucos interessados nas atribuições, submete-se o evidenciado ao risco da insegurança quanto ao aspecto geral.

Avaliações, em matéria contábil, para serem justas devem ser “objetivas” evitando o “aleatório”.

O critério de alternativas é o da apologia da imprecisão porque o lógico não admite a contradição (uma coisa não pode ser e deixar de ser ao mesmo tempo) e muito menos o impreciso.


BIBLIOGRAFIA

BAXTER, W.T. - Accounting Values and inflation, edição McGraw Hill, Bristol, 1975

BESTA, Fábio - La Ragioneria, vols. I, II, III, edição Vallardi, Milão, 1929

BRILLOF, Abraham J. - More debts than credits, edição Harper & Row, Nova York, 1976

FERREIRA, Leonor Fernandes – Modelos de avaliação de empresas e utilidade da informação contabilística – dissertação de doutorado em Gestão de Empresas, Universidade Lusíada, Lisboa, 2004

FERREIRA, Rogério Fernandes – Contabilidade em mudança, em Valor Acrescentado, nº. 8, Luanda, Dezembro de 2007

JOHNSON, Sarah – IRFS: No Longer If, but When, em CFO.com Magazine, New York, 8 de fevereiro de 2008 e The many interpreters of IRFS , em CFO.com Magazine, New York, 28 de novembro de 2007

KATZ, David M. - Fair-Value Question Stalls Derivative Standard, em CFO com., 01/04/2008

MORRIS, James E. – Accounting for M & A, Equit, and credit analysts, edição Mc Graw Hill, New York, 2004

RAPPEPORT, Alan – One standard, many Laws, em CFO Magazine, New York, 01 de abril de 2008

ROSSI, Giovanni - L’ente economico-amministrativo, vols I e II, edição Stabilimento Tipo-Litografico degli Artigianelli, Regio dell’Emilia, 1882

TORRE, Pedro Rivero – El concepto de imagen fiel y el Plan General de Contabilidad, em Comentarios sobre el nuevo plan general de Contabilidad, edição ICAC, Ministério de Economia e Fazenda da Espanha, Madri, 1993

ZAPPA, Gino – Il rédito di impresa, 2a. edição Giuffré, Milão, 1946