Merece ponderações o que vem sendo apresentado como se fosse uma “nova Contabilidade” trazida do hemisfério norte, através de Normas ditas “Internacionais”.
A simples leitura das referidas por quem possui cultura técnica de nível médio evidenciará que nenhuma coisa de “essencial” se acrescentou ao que existia; ocorreu, sim, alguma confusão conceptual, a produção de textos que resultaram em exposições de contestável clareza, uma apresentação ao feitio da visão dos que as produziram.
Facultado ficou o “subjetivismo”, ostensivamente pregou-se o desrespeito à lei, lesionaram-se alguns preceitos fundamentais de natureza científica.
Intensa publicidade, entretanto, prossegue sendo feita sobre a matéria como se “inovação salvadora” estivesse a suceder e uma “nova Contabilidade” a surgir.
Como “ser atualizado” é imagem que muitos seres apreciam ostentar, impressionados com as motivações publicitárias, mesmo sem refletir e examinar a realidade e os efeitos do que lhes é repassado, a opção eleita é quase sempre a de não questionar, nem indagar.
Essa uma das razões pelas quais, por paradoxal que possa parecer, existem coisas apresentadas como “novidades” e que são, em realidade, roupagens da moda em corpos antigos.
Como se pinta uma parede velha para dar-lhe o aspecto de nova, assim, também, idéias vetustas, conceitos já amarelejados no tempo, recebem intitulações diferentes, surgindo como “inovação” progressista.
Também, com intenções similares, outras vezes, mascaram-se processos inadequados e se apresentam os mesmos como algo excelente.
Ignorância a respeito da História, débil cultura doutrinária científica, fraca memória, renúncia a reflexão, são responsáveis, em grande parte, por tais situações.
Séculos às vezes se passam ocultando verdadeiras conquistas da mente humana; mais tarde, surge o “ignorado” como “grande descoberta”; assim ocorreu, por exemplo, com a utilização da força do vapor, esta que já era empregada no Egito Antigo, mas que só milênios depois seria tida como uma conquista do século XVIII de nossa era; também os robôs que são tidos como conquistas da modernidade já existiam no tempo de Cristo, inventados há cerca de 2.000 anos por Heron, também no Egito; novas roupagens vestiram tais matérias, mas as bases, as “essências” continuam sendo as mesmas.
A expressão “superado”, usada para desqualificar obras expressivas, traduz falta de responsabilidade perante a cultura, além de manifestação aética.
Todas as épocas abrigaram seres de mentalidade superior, acima da média cultural de seus tempos e foram eles os que edificaram a civilização, merecendo respeito e gratidão.
Muita coisa do passado é digna de apreço e o presente, o hoje, é apenas um efeito do já vivido.
A cultura se constrói de ocorrências sedimentadas ao longo dos anos.
Não se despreza um bem conquistado com valor; o máximo que se deve fazer é acrescentar-lhe utilidade.
Estudo recente, profundo, realizado sobre a vida de empresas que possuem mais de 100 anos, chegou à conclusão que foi o respeito às tradições, em cada uma delas, que lhes permitiu sobreviver, enquanto a quase totalidade faleceu precocemente.
As coisas deveras eficazes, verdadeiras, sensíveis, basta que as adaptemos, respeitando as qualidades.
Porque algo foi pensado, praticado ou feito há muito tempo não significa que é inútil, nem que está “ultrapassado”.
Não são poucas as obras antigas que jamais foram superadas, quer no campo da filosofia, da ciência e da arte.
A inteligência do homem está em saber tirar proveito do bom, tenha este que idade tiver.
Nunca podemos nos esquecer que o movimento de renovação da humanidade, o grande passo do medieval ao moderno, estruturou-se no “velho”, ou seja, no apelo à filosofia de Platão e às formas gregas da antiguidade clássica, ou seja: “na apresentação de um novo antigo”, por paradoxal que possa parecer.
O famoso autor do primeiro livro impresso sobre partidas dobradas, Luca Pacioli, estribou-se na milenar filosofia platônica para escrever a sua obra “Das Divinas Proporções”, estas que consta foram ensinadas pelo frei a Leonardo da Vinci.
Admitir, pois, ser necessário “esquecer” tudo que havia em Contabilidade para aprender de novo com as ditas Normas Internacionais é algo insensato, como o é imaginar que estas sejam a própria ciência contábil.
Jamais através do normativo referido será possível estabelecer modelos de comportamento da riqueza ou oferecer fórmulas para a prosperidade das empresas, pois, tais coisas são prerrogativas da cultura científica.
As normas estão limitadas ao campo dos registros, das demonstrações, visando a informar, sendo apenas uma técnica, não o conhecimento superior da Contabilidade.
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