por Marcelo Henrique da Silva
Março/2010
Março/2010
Um dia considerei conveniente me interrogar. Entre outras coisas eu, eu contador...
Foi então que numa noite, trazido misteriosamente pelo acaso, deparei-me com o livro Instabilidade Perpétua, de Juliano Garcia Pessanha. Eu o li, em vários goles. Ao terminar, percebi meu coração pulsando. Ele havia me interrogado, não, interpretado... eu contador? Sim, assim:
“Eu sou um homem sob medida. Eu caminho no interior de uma moldura. Eu não aconteço, eu me assisto. Eu não fluo e o desconhecido não cerze caminhos através de mim. Cada gesto que vou executar já esta narrado. Vivo num mundo sem irrigação, sem veia e sem fluência, antimundo onde nada é livre, onde nada ficou encoberto”.
Sou um homem inteiramente ajustado às medidas de uma moldura, uma caixa. Alguma caixa contábil, moldura.
Mesmo quando não caibo inteiro e perfeitamente no formato desta caixa do ideal, tento fingir minhas medidas, esquecendo ou encobrindo as partes que ficaram de fora. Sou padronizado, padrões, correntes contábeis.
Recebi medidas da própria trajetória profissional, sem duvidar.
A dúvida é um perigoso sinal de fé-contábil vacilante. A atividade contábil é uma repetição das coisas já sabidas sem dúvidas, padronizadas, emolduradas. O objetivo não é ensinar a pensar, mas formar pastores fiéis que cuidam que suas ovelhas não sejam perturbadas por ideais estranhos. Tudo, menos pensar. O ideal é aquele que não faz perguntas por já possuir as respostas, padronizadas.
As regras não tem brechas. A certeza é uma virtude. É a aderência total do intelecto aos dogmas.
A vantagem de regras fixas, padronizadas, para o comportamento profissional... Elas nos liberam de tomar decisões. Estabelecidas as regras, as decisões já estão tomadas.
Afinal, qual o meu nome? Eu contador...
Mas quando sonho, sou outro; inauguro-me. Em mim moram muitos. De uns eu gosto, de outros não. Gosto daquele que ri, um palhaço. Alguns poucos conhecem a exuberância deste sorriso, pois a grande maioria passa a vida inteira submetida a padrões, ou se ajustando a medidas representadas pelas molduras. Escravos fazedores de escravos!
Aqui estou, prisioneiro de minha mudez. Aflito e em pranto, no silêncio grave... eu contador...
Marcelo Henrique da Silva, é contador em Londrina.
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