domingo, 26 de abril de 2009

PATRIMÔNIO E AS APLICAÇÕES SOCIAIS

Werno Herckert*
Contador

Há necessidade de reflexão do empresário sobre o aumento da capacidade funcional do patrimônio da célula social e as aplicações no entorno social.

Toda empresa tem função social. Ela se relaciona com o entorno. Há inteiração constante entre a organização e o ambiente onde ela está inserida e influencia a comunidade como recebe influência dessa sociedade. Isso é axiomático. Esta matéria não é nova, pois, Schmalenbach expoente da doutrina Reditualista na Alemanha expressou sua preocupação com o social e as pressões do ambiente externo que é seu entorno. Também, Rudolf Dietrich do Aziendalismo ensinava que a ¨Azienda devia estar a serviço da sociedade produzindo emprego, contribuindo para o fortalecimento do estado e assim, sob essa ótica, deveria ser estudada.¨ (Ver História das doutrinas da contabilidade, Prof. Lopes de Sá, pg, 94, Atlas, 1997).

Observamos, ultimamente, que a crise financeira americana tem influenciado o patrimônio da célula social no Brasil e no exterior criando sérios problemas à empresa diminuindo sua capacidade funcional, como também, na economicidade, isto é em sua sobrevivência e, assim, criando problemas sociais pelo desemprego. Em meu livro Patrimônio e as influências ambientais, Reas, Três de Maio, 2003 tratei sobre a influência ambiental hexógena e, mais uma vez, se comprova a importância, da pesquisa e reflexão sobre a influência externa sobre o patrimônio da empresa.

Quando há diminuição da capacidade funcional do patrimônio há prejuízo social e quando há prosperidade patrimonial há benefício social. O desejável é que haja eficácia na dinâmica patrimonial e que a empresa cresça e possa aplicar recursos no social beneficiando, assim, a comunidade. As aplicações são possíveis quando o patrimônio da célula social tem prosperidade patrimonial isto é, quando há aumento da capacidade funcional do capital. O aumento patrimonial por reajuste monetário não é prosperidade do patrimônio. O importante é que o capital cresça pela inteiração harmônica e eficácia em todos os sistemas da Liquidez, da Resultabilidade, da Produtividade, da Elasticidade, da Invulnerabilidade, da Estabilidade, da Economicidade e da Socialidade. Quando isso ocorre, na célula social, há possibilidade de aplicações sociais. O fundamental é que a avaliação patrimonial seja, como ensina o neopatrimonialismo contábil, pela ¨capacidade funcional¨, ou seja, a que se traduz pela ¨eficácia¨. A avaliação deve seguir o caminho da ciência que é objetiva e procura a verdade e pela verdade é que se consegue avaliar a prosperidade patrimonial da célula social e suas aplicações no entorno.

Há n problemas sociais que a empresa pode auxiliar em suas possíveis soluções quando há prosperidade do capital. Sobre esta matéria abre-se um campo de pesquisa e reflexões sem limites sobre a correlação dos sistemas de funções com as relações sociais mesclando, assim, o contábil, o administrativo e o social. Cada vez mais os interesses sociais passam a ser objeto de estudos da ciência contábil e neles se associam os fatores humanos e do entorno como agentes transformadores e agregáveis e, assim, a ciência contábil é responsável pela prosperidade da comunidade.

Sabe-se, hoje, que o cliente é um fator humano fundamental à empresa e que observa a organização que tem preocupação na solução dos problemas do entorno. Em meu artigo Conhecimento: um ativo imaterial mencionei uma citação do Skyrme o cliente como um ativo intangível na empresa. (Ver: Ativo intelectual e capital humano, pg. 12, Reas, Três de Maio, Nov/2002).

O empresário deve preocupar-se com as questões internas da empresa, mas também com o entorno e não esquecer que as influências ambientais hexógenas pressionam o patrimônio constantemente e podem levar a organização ao crescimento, estagnação e a falência e para que se possa aplicar no social é necessário que a empresa tenha sua capacidade funcional voltada à eficácia e, assim, contribuir para o bem estar da humanidade.

*Membro da Academia Brasileira de Ciências Contábeis.
Membro da Associação Científica Internacional do Neopatrimonialismo.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

CRISE E RECUO EM NORMA CONTABIL

Antônio Lopes de Sá


CRISE SOBRE CRISE
Surgem interrogações se teremos crises derivadas da crise atual, se nova tempestade se prenuncia nos céus financeiros; pela natureza das nuvens, sim, é possível prever as tormentas; metaforicamente, pois, na economia as informações contábeis, como se fossem nuvens, podem ser responsáveis por borrascas.


Segundo comentaristas e especialistas internacionais existem ensejos de “crise derivada de crise”.


Isso porque muito significa o que as empresas informam sobre as situações patrimoniais, de lucros e perdas.


INFORMAÇÃO E PODER
Influir sobre a forma de apresentar as demonstrações contábeis das empresas é, inquestionavelmente, algo determinante na formação dos cenários bursáteis e econômicos, por que informação é poder; se quem exerce tal força é incompetente ou faccioso, inquestionavelmente podem defluir situações caóticas e de crises.


Merece atenção pública, pois, o comportamento dos órgãos aos quais se outorga o exercício da faculdade de impor modelos de registrar e demonstrar.


MAIORIA ABSOLUTA É REGIDA PELO CÓDIGO CIVIL
Estão obrigadas a espelhar situações reais e fieis em seus balanços 99,99% das empresas nacionais por força do Código Civil Brasileiro de 2002 (este em total vigor); o mesmo, todavia, não ocorre em relação às sociedades por ações; ou seja, enquanto o Código referido determina ostensivamente a exigência de realidade e fidelidade no artigo 1.188, tais deveres não são ostensivamente exigidos pela lei das sociedades por ações.

Em nosso País, todavia, para a maioria absoluta das empresas, serão atentados contra a lei as adoções de regras, resoluções, instruções, procedimentos e normas que induzam ao inverídico ou a infidelidade informativa nos balanços; seguir determinação seja de que natureza for, pois, no que possa ensejar infidelidade ou irrealidade em sociedade comercial que não seja anônima e nem de grande porte é infringir o artigo 1.188 aludido; como as denominadas “normas internacionais” possuem algumas orientações que podem motivar lesão à fidelidade e à realidade informativa, o profissional que as seguir poderá vir a ser responsabilizado criminal e civilmente por isso, considerada a qualidade de preposto que possui.


CONTABILIDADE CRIATIVA
As normas denominadas “internacionais” contêm “alternativas”, possuem avanços e recuos, podendo comprometer a verdade demonstrativa segundo a opinião já de há muito exaradas por acreditados intelectuais (Briloff, Zeff, Turler, Taylor, Breda, Hendriksen, Fernandes Ferreira, Cravo, Nepomuceno etc.); sobre o mesmo perigo ocorreram advertências nos Senados dos Estados Unidos (Senador Lee Metcalfe) e do Brasil (Senador Gabriel Hermes).


Comprovam as apreensões o que o FASB (Financial Accounting Standard Board), órgão normatizador contábil nos Estados Unidos, acaba de demonstrar com a contramarcha em sua norma 157, ou seja, a relativa ao valor de mercado (que tem conceituado como Valor Justo), ensejando a prática ao que se denomina pejorativamente de “Contabilidade Criativa”.


O que antes era válida como regra, em sentido amplo, deixa de ser ampla, permitindo dentro do que já era alternativa, outra alternativa; ou ainda, valor de mercado antes apresentado como “absoluto”, transforma-se agora em “relativo”.


RECUO E ATIVOS PODRES
Segundo o que se infere dos textos de Martin Burbridge, para atender a circunstância do momento, comprova-se que o “normativo contábil” se encontrou mais a serviço de “políticas” que da “fidelidade informativa” (artigo editado no “El Cronista Comercial” - “La contabilidad creativa en EE.UU. promete nuevas burbujas en el mercado”, 16 de abril corrente, Buenos Aires e NETLEGIS, na Internet em 17 de abril).


A aludida medida que enseja a instabilidade entra em vigor com toda a “pompa e circunstância”, bem ao feitio da soberania da entidade de classe estadunidense, acolhida também pela que se denomina internacional, a “IASB”.


Confirmam-se, dessa forma, os fatos que há mais de 30 anos foram motivos de advertências e acusações pelo senado dos Estados Unidos, ou seja: que as entidades de classe contábil produziam normas ao sabor das vontades dos profissionais dirigentes e que estes as exerciam atendendo ao que servia aos interesses particulares dos mesmos.


Portanto, agora, em renovada edição, para “socorrer beneficiados”, os chamados “ativos tóxicos” ou “ativos podres” podem ser maquiados.


Segundo noticia a imprensa teriam sido os Bancos os que mais se interessaram pela medida.
Com isso, nova “bolha” tenderá a ser criada e poderá, naturalmente, ao longo do tempo produzir danos similares aos atuais.


Falta de realidade informativa contábil é anteparo para crises financeiras e econômicas como a atual e o será sempre; ninguém investe em empresas que possuem ativos podres e se investir é porque foi enganado quanto à informação - isso é axiomático.


Burbridge adverte, pois, para que prepare-se o mercado, para a probabilidade da repetição de fatos indesejáveis, favorecidos pela “volatilidade” normativa; isso por que, repita-se, informação é poder e aquela contábil tem efeitos concretos sobre a economia, notadamente sobre a especulação bursátil.


Vários balanços poderão vir a ter sensíveis melhorias, agora agasalhados pelas maquiagens de números, em famosos “ajustes” que as normas denominadas “internacionais” tanto proclamam como vantagens, pela força do alternativo que ensejam.


O que passou a ser conhecido como “ativo tóxico” (nome menos grosseiro que “ativo falso ou podre”), vai receber benefício de “desintoxicação” em virtude da “marcha à ré” das normas (que o IASB, também, acolheu) segundo se noticia.


Em decorrência de tal permissibilidade agora implantada nessa “marcha à ré” da norma 157 do FASB: “deram a chave da adega ao alcoólatra”, segundo afirma o já referido artigo de Martin Burbridge.


NORMAS INTERNACIONAIS E MODELO RECUSADO
Em plena recessão, no eclodir do desemprego, não será estranhável que lindos balanços sejam apresentados, graças às “concessões normativas”; nem será surpresa se péssimos demonstrativos vierem depois a suceder, facilitando a especuladores bursáteis.


Caminho correto, pois, para os contadores em nosso País será o de seguir o que determina o Código Civil Brasileiro de 2002 quanto à fidelidade e realidade dos balanços, sendo temerário seguir normas que estejam a desrespeitar tais princípios, como deveras existem várias.


A posição do IASB, do FASB, está, no recuo em tela, como em algumas outras questões já demonstradas em artigos meus precedentes, na contramão da ciência, da realidade, de nossa legislação (textos editados em http://www.lopesdesa.com.br/ e em meia centena de páginas na Internet).

A Contabilidade não é um jogo de cartas, ou seja, recusa o incerto, sendo regida por princípios científicos ligados à realidade objetiva; as informações, embora apenas instrumentos, necessitam merecer credibilidade, mas, para isso devem estar aferradas ao verdadeiro, em face do relevante papel que representam socialmente.


E a verdade só tem uma face... A realidade requer racionalidade, ou seja, clama pelo objetivo e não pelo empírico gerado no subjetivismo em nações que se apresentam como paradigmas.
O modelo dos Estados Unidos, segundo o Presidente da Real Academia de Ciências Econômicas e Financeiras da Espanha, Dr. Jaime Gil Aluja, em pronunciamento complementar a admissão em março de 2009, do ex primeiro ministro da Itália e chefe do parlamento europeu, Romano Prodi naquele sodalício, foi enfático em afirmar que é preciso mudar o modelo da arrogância financeira norteamericana; afirmou que essa se entendendo infalível arrastou todo o mundo em uma crise sem precedentes.


Críticas complementares em sentido do normativo contábil defluiram, dentre outros, de Nepomuceno, um dos maiores teóricos da Contabilidade em nosso País, repudiando os vícios do sistema estadunidense.


O Presidente Dr. Gil Aluja dissertou ainda sobre a perda da moralidade pela mentira do regime imposto pelo padrão financeiro estadunidense que estabeleceu uma ruptura entre o econômico e a realidade; falou sobre um campo assentado sobre areias movediças, inspirado no artificial, em um falso modelo cultural no campo dos empreendimentos (aonde se insere a informação contábil); no mesmo sentido, defendendo o mesmo ponto de vista, poucos meses antes se havia pronunciado Nicolas Sarkosy, na presidência do parlamento da Comunidade Européia.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Crise, Receita Federal e normas contábeis

Gazeta Mercantil
Direito Corporativo22/04

Antonio Lopes de Sá

A meta do superávit primário do Brasil em 2009 foi reduzida de 3,8% para 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB) segundo divulgou o Ministério da Fazenda.

A crise financeira pela qual passa o mundo, envolvendo trilhões de dólares, sacrificando populações, é efeito de causas perversamente inequívocas e a nós também alcança.

De uma ou de outra forma, direta ou indiretamente, somos vítimas de um somatório cruel de lacunas que estão sendo importadas.

Fala-se muito dos efeitos, mas, pouco se têm analisado as verdadeiras causas do que golpeia a nossa economia.

Não houvesse especulação, falsidade informativa, omissão estatal e jamais tal desastre atingiria a economia das nações.

Foram lesados cofres públicos, inúmeros seres e entidades sem fins lucrativos que pouparam com dificuldades, operários, empresas produtoras, em suma, o sinistro tem grave dimensão conforme diariamente a imprensa nacional e internacional tem noticiado.

Comprova-se, pelos efeitos inequívocos evidenciados pela crise, a debilidade da tão alardeada cultura econômica, administrativa e contábil do mundo anglosaxão, pois, houvesse competência inequívoca e as coisas não estariam tal como se acham; contra fatos falecem argumentos.

A introdução no Brasil, pela Lei 11.638/07, com efeitos compulsórios, das mesmas normas contábeis que alimentaram os defeitos de informação agasalhadores da crise, é algo preocupante, por que atinge às grandes empresas.

A evidência de lucros e perdas mirabolantes, espelhados em balanços que já estão sendo publicados, tem efeitos deveras impactantes no mercado e nos cofres públicos e estão a dar margem a comentários e notícias que levantam contraditórios.

O que se está denominando como "nova Contabilidade" é um sistema que existe há muitas décadas, que promoveu impactos altamente negativos, em evidencias de fraudes e crises sucessivas difundidas em jornais de muitas partes do mundo.

Como denunciou na obra "Teoria da Contabilidade" (edição Juruá) o emérito professor Valério Nepomuceno, trata-se de um conluio que denominou de "tríplice aliança" entre: especuladores, auditores e entidades de classe.

Essa mesma afirmação referida é a que se encontra detalhada no relatório do Senador Lee Metcalf, apresentado em comissão parlamentar de inquérito há mais de 30 anos, dirigido ao presidente da comissão Abraham Ribicoff.

O Parlamento dos Estados Unidos acusou os auditores de incompetentes ou coniventes, em face das constatadas fraudes do mercado de capitais, em razão do permitido pelos adotados Princípios e Normas de Contabilidade; o referido relatório afirmou que os auditores haviam dominado a entidade principal de classe dos contadores e fizeram dela o instrumento de seus particulares interesses no sentido de produzir normas (página 9 do Sumário da edição do U.S. SENATE - The accounting establishment, U.S. Government Printing Office ,Washington, 1977 -Relatório da Comissão Particular de Inquérito sobre Conluio em Contabilidade, número de estoque da publicação 052.071.00514-5 , com 1.760 páginas).

Em 1976, eu já havia recebido uma especial correspondência do emérito professor Briloff, da Universidade de Nova York que acompanhava livro de autoria do mesmo (BRILOFF, Abraham J. - More debts than credits, edição Harper & Row, Nova York, 1976), assim como vários artigos (editados no prestigioso jornal Barron´s) chamando atenção para os gravíssimos problemas que ocorriam nos Estados Unidos, ligados ao aludido processo existente no Senado.

Como desde o inicio dos anos 60 ostensivamente eu acompanhava com intensidade o movimento normativo, participando de comissões internacionais na Comunidade Européia, congressos, na de 70 publicando a primeira obra no Brasil sobre o tema e na de 80 em Genebra, integrando comissão na O.N.U. (tudo sobre o assunto), prossegui pesquisando e acompanhando com raro interesse a questão.

Jamais me insurgi contra normas, apenas discordo do processo como estão sendo implantadas; ou seja, com o caráter de compulsoriedade e elaboradas sob um regime metodológico que entendo não científico contabilmente (assim, quanto à metodologia na busca da verdade, também entenderam Lyotard, um dos mais festejados filósofo da França no século XX e Albert Einstein).

Hoje me sinto a vontade para afirmar que a falsidade informativa que as normas podem ensejar é fator preocupante quanto a ordem social, tributária e econômica.

A Receita Federal do Brasil, a UNAFISCO, têm-se manifestado altamente preocupadas com a matéria, segundo estamos informados.

Em meu entendimento, a imunidade tributária sobre os ajustes que a lei 11.638/07 estabelece poderão ensejar questionamentos por parte das referidas entidades, no que tange ao caráter de "subjetividade" empregado na atribuição de valores patrimoniais.

O fato do que se denominou IRFS, como base para o normativo, colocar-se acima da lei poderá, por si só, ser matéria para contraditórios por parte da Receita Federal do Brasil nos questionamentos que possa vir a fazer; isso por que a lei 11.638/07 que consagra as normas não pode deixar de consagrar o próprio império da lei (em assim não sendo estaria implantada a desobediência civil, ou ainda, a anarquia).

O sistema baseado no Padrão Internacional de Contabilidade (IFRS, na sigla em inglês), agora obrigatório no Brasil para grandes empresas, impactará significativamente valores de ativos, em decorrência, também os dos resultados, e, bafejado pela "volatilidade" permitida, certamente ensejará muita discussão no campo tributário.

(Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 11)(Antônio Lopes de Sá - Doutor em Ciências Contábeis pela Universidade do Brasil, doutor em Letras, H.C., pela Samuel Benjamin Thomas University, de Londres (Inglaterra), administrador, economista e professor universitário. )

sábado, 18 de abril de 2009

DESOBRIGATORIEDADE DE AUDITORIA INDEPENDENTE NAS GRANDES LIMITADAS

Marcelo Henrique da Silva – Abril/2009

No filme A Loja Mágica de Brinquedos o contador é um personagem que só trabalha (só vê números à sua frente). Não lhe sobra tempo pra mais nada. Ele nunca pára de trabalhar. Inclusive, uma das crianças (ah! a magia das crianças) lhe propõe uma partida-brincadeira de xadrez, naquele momento ou mesmo depois do expediente, mas o profissional, convicto, afirma que não será possível, pois nunca pára de trabalhar.

Este contador sequer consegue perceber a magia da loja, sua alma de criança está escondida atrás do metódico mundo dos números (sic). Em certo momento, este é, inclusive, taxado como o culpado pelo fim da magia da loja! A culpa é do contador!

Por certo, cada ponto de vista é a vista de um ponto. Cada um lê com os olhos que tem, e interpreta a partir de onde os pés pisam.

O contador que só trabalha no metódico mundo dos números, não consegue pensar, não consegue aprender a aprender, não conhece a arte da dúvida, a arte da pergunta, a arte da consciência crítica; é um eterno repetidor de informações (é mais fácil citar ou pensar?), não alçará vôos maiores, ou como diria o teólogo Leonardo Boff, em seu metafórico livro A Águia e a Galinha, tornar-se-á uma galinha trabalhadora, onde, em oposição, a águia voa e vê ao longe – um futuro, talvez?

Penso estar evidente que, ou pensamos e nos tornamos águia, ou repetimos informações e permanecemos galinhas. A escolha é sua!

Dando um passo adiante, o direito, sabemos, é um fenômeno complexo. Uma forma, porém, de estudá-lo sem ter de enfrentar o problema de sua ontologia é isolar as manifestações normativas.

Destaco, para observações, o caput do art. 3º da Lei nº 11.638/07, “aplicam-se às sociedades de grande porte, ainda que não constituídas sob a forma de sociedades por ações, as disposições da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, sobre escrituração e elaboração de demonstrações financeiras e a obrigatoriedade de auditoria independente por auditor registrado na Comissão de Valores Mobiliários”.

A primeira parte deste dispositivo, já estudado em outro escrito, prescreve dois comandos: 1) aplica-se o novo padrão contábil às sociedades de grande porte LTDA; 2) não se aplica o novo padrão contábil às sociedades que não enquadradas na condição de “grande porte LTDA” (anote: mandou aplicar às de grande porte, e só).

A segunda parte, agora em análise, prescreve que aplicam-se às sociedades de grande porte a obrigatoriedade de auditoria independente por auditor registrado na Comissão de Valores Mobiliários.

Temos aqui um enunciado com organização (regras) interna de proposições condicionais, em que se enlaça determinada conseqüência à realização de um fato. Dentro deste arcabouço, a hipótese refere-se a um fato de possível ocorrência, enquanto o conseqüente prescreve a relação jurídica que se vai instaurar, onde e quando acontecer o fato cogitado no suposto normativo.

Em outras palavras, a hipótese normativa do art. 3º é de que aplicam-se às sociedades de grande porte a obrigatoriedade de auditoria independente por auditor registrado na Comissão de Valores Mobiliários, entretanto a relação jurídica só se instaura quando no universo fenomênico se verificar a ocorrência daquela hipótese, qual seja, uma sociedade de grande porte.

Vale anotar, a hipótese do art. 3º é obrigar a sociedade de grande porte; uma sociedade de pequeno porte não se enquadra nas proposições condicionais, portanto não se subsume ao conseqüente da norma. Por outro lado, basta que uma sociedade seja de grande porte para que se instaure a relação jurídica obrigacional.

Mas, como visto, as normas jurídicas têm regras internas!

Ocorre que, como demonstra o mestre Paulo de Barros Carvalho, na completude, as regras do direito tem feição dúplice: norma primária, a que prescreve um dever; norma secundária, a que prescreve uma providência sancionatória.

Segundo Carvalho, inexiste regras jurídicas sem as correspondentes sansões, isto é, normas sancionatórias.

Quando se fala em incidência jurídica, é necessário questionar: qual a sansão pelo seu não cumprimento?

As duas regras internas, juntas, formam a norma completa, expressam a mensagem deôntica-jurídica na sua integridade constitutiva, significando a orientação da conduta, juntamente com a providência coercitiva que o ordenamento prevê para o seu descumprimento.

Caso imaginássemos um enunciado estabelecendo ser obrigado possuir habilitação legal para a condução de veículo automotor (art. 140, CTB), sem que se estabelecesse penalidade pelo seu descumprimento (art. 161, CTB), estaríamos no campo dos preceitos morais, educacionais, etc...

Firmemos esse conceito: não há regra jurídica sem a correspondente sansão.

Muito bem. Cumprida esta etapa, vem a questão: qual a sansão às sociedades de grande porte que não cumprir a obrigatoriedade da auditoria independente por auditor registrado na Comissão de Valores Mobiliários?

Resposta: nenhuma!

Quando se verifica no art. 3º as regras do direito, temos como norma primária, a obrigatoriedade de auditoria; já a norma secundária, a que prescreveria uma providência sancionatória, é ausente, não existe.

Perfeitamente justificável que tal sansão faça parte de outros enunciados prescritivos, no contexto do sistema de que fazem parte. No caso o ordenamento jurídico pátrio.

Posto isto, de imediato vem a mente a Lei nº 6.385, de 1976, prescrevendo em seu art. 11 que a CVM poderá impor aos infratores das normas da Lei das S/A, bem como de outras normas legais cujo cumprimento lhe incumba fiscalizar, as penalidades legais (enumeradas).

Entretanto, nesse ponto, é preciso anotar, enfaticamente, que a Lei nº 6.385 só se aplica às sociedades disciplinadas e fiscalizadas pela CVM, ou seja, as sociedades anônimas, o que não é o caso das “sociedades LIMITADAS de grande porte”.

Torna-se necessário um esforço concentrado para mergulhar na restrição textual do art. 3º da Lei nº 11.638/07, para compreender que a aplicação da Lei nº 6.404/76 às sociedades de grande porte LTDA se resumem à escrituração e elaboração de demonstrações financeiras. Por esse modo, é forçoso reconhecer, que essas sociedades de grande porte não estão subordinadas à fiscalização da CVM.

Nunca é demais destacar que o Princípio da Legalidade é limite objetivo que se presta a oferecer segurança jurídica as pessoas.

Os enunciados da Lei nº 11.638/07, estabelecem como norma primária, a obrigatoriedade de auditoria; entretanto é ausente na norma secundária, a que prescreveria uma providência sancionatória. Estamos, então, diante de preceitos não impositivos, ou seja, morais, educacionais, etc...

O legislador, no caso concreto, recomenda a auditoria, não impõe a auditoria.

A prática mostra que se nós aceitarmos, pura e simplesmente aquilo que os eruditos dizem, corremos o risco de ficar redondamente enganados pela singela leitura dos textos.

Eis a sistemática desta diretriz, não há regra jurídica sem a correspondente sansão.

Por derradeiro vale advertir que mesmo as profissões ditas intelectuais alienam-se por completo do prazer de pensar, através de sua crescente assimilação do fazer.

*Marcelo Henrique da Silva, é contador em Londrina.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

CRISE, RECEITA FEDERAL E NORMAS CONTÁBEIS

Antônio Lopes de Sá

A meta do superávit primário do Brasil em 2009 foi reduzida de 3,8% para 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB) segundo divulgou o Ministério da Fazenda.

A crise financeira pela qual passa o mundo, envolvendo trilhões de dólares, sacrificando populações, é efeito de causas perversamente inequívocas e a nós também alcança.

De uma ou de outra forma, direta ou indiretamente, somos vítimas de um somatório cruel de lacunas que estão sendo importadas.

Fala-se muito dos efeitos, mas, pouco se têm analisado as verdadeiras causas do que golpeia a nossa economia.

Não houvesse especulação, falsidade informativa, omissão estatal e jamais tal desastre atingiria a economia das nações.

Foram lesados cofres públicos, inúmeros seres e entidades sem fins lucrativos que pouparam com dificuldades, operários, empresas produtoras, em suma, o sinistro tem grave dimensão conforme diariamente a imprensa nacional e internacional tem noticiado.

Comprova-se, pelos efeitos inequívocos evidenciados pela crise, a debilidade da tão alardeada cultura econômica, administrativa e contábil do mundo anglosaxão, pois, houvesse competência inequívoca e as coisas não estariam tal como se acham; contra fatos falecem argumentos.

A introdução no Brasil, pela Lei 11.638/07, com efeitos compulsórios, das mesmas normas contábeis que alimentaram os defeitos de informação agasalhadores da crise, é algo preocupante, por que atinge às grandes empresas.

A evidência de lucros e perdas mirabolantes, espelhados em balanços que já estão sendo publicados, tem efeitos deveras impactantes no mercado e nos cofres públicos e estão a dar margem a comentários e notícias que levantam contraditórios.

O que se está denominando como “nova Contabilidade” é um sistema que existe há muitas décadas, que promoveu impactos altamente negativos, em evidencias de fraudes e crises sucessivas difundidas em jornais de muitas partes do mundo.

Como denunciou na obra “Teoria da Contabilidade” (edição Juruá) o emérito professor Valério Nepomuceno, trata-se de um conluio que denominou de “tríplice aliança” entre: especuladores, auditores e entidades de classe.

Essa mesma afirmação referida é a que se encontra detalhada no relatório do Senador Lee Metcalf, apresentado em comissão parlamentar de inquérito há mais de 30 anos, dirigido ao presidente da comissão Abraham Ribicoff.

O Parlamento dos Estados Unidos acusou os auditores de incompetentes ou coniventes, em face das constatadas fraudes do mercado de capitais, em razão do permitido pelos adotados Princípios e Normas de Contabilidade; o referido relatório afirmou que os auditores haviam dominado a entidade principal de classe dos contadores e fizeram dela o instrumento de seus particulares interesses no sentido de produzir normas (página 9 do Sumário da edição do U.S. SENATE - The accounting establishment, U.S. Government Printing Office ,Washington, 1977 -Relatório da Comissão Particular de Inquérito sobre Conluio em Contabilidade, número de estoque da publicação 052.071.00514-5 , com 1.760 páginas).

Em 1976, eu já havia recebido uma especial correspondência do emérito professor Briloff, da Universidade de Nova York que acompanhava livro de autoria do mesmo (BRILOFF, Abraham J. - More debts than credits, edição Harper & Row, Nova York, 1976), assim como vários artigos (editados no prestigioso jornal Barron´s) chamando atenção para os gravíssimos problemas que ocorriam nos Estados Unidos, ligados ao aludido processo existente no Senado.

Como desde o inicio dos anos 60 ostensivamente eu acompanhava com intensidade o movimento normativo, participando de comissões internacionais na Comunidade Européia, congressos, na de 70 publicando a primeira obra no Brasil sobre o tema e na de 80 em Genebra, integrando comissão na O.N.U. (tudo sobre o assunto), prossegui pesquisando e acompanhando com raro interesse a questão.

Jamais me insurgi contra normas, apenas discordo do processo como estão sendo implantadas; ou seja, com o caráter de compulsoriedade e elaboradas sob um regime metodológico que entendo não científico contabilmente (assim, quanto à metodologia na busca da verdade, também entenderam Lyotard, um dos mais festejados filósofo da França no século XX e Albert Einstein).
Hoje me sinto a vontade para afirmar que a falsidade informativa que as normas podem ensejar é fator preocupante quanto a ordem social, tributária e econômica.

A Receita Federal do Brasil, a UNAFISCO, têm-se manifestado altamente preocupadas com a matéria, segundo estamos informados.

Em meu entendimento a imunidade tributária sobre os ajustes que a lei 11.638/07 estabelece poderão ensejar questionamentos por parte das referidas entidades, no que tange ao caráter de “subjetividade” empregado na atribuição de valores patrimoniais.

O fato do que se denominou IRFS, como base para o normativo, colocar-se acima da lei poderá, por si só, ser matéria para contraditórios por parte da Receita Federal do Brasil nos questionamentos que possa vir a fazer; isso por que a lei 11.638/07 que consagra as normas não pode deixar de consagrar o próprio império da lei (em assim não sendo estaria implantada a desobediência civil, ou ainda, a anarquia).

O sistema baseado no Padrão Internacional de Contabilidade (IFRS, na sigla em inglês), agora obrigatório no Brasil para grandes empresas, impactará significativamente valores de ativos, em decorrência, também os dos resultados, e, bafejado pela “volatilidade” permitida, certamente ensejará muita discussão no campo tributário.

MAIOR VALIA DA EMPRESA E FALSIDADE INFORMATIVA

Antônio Lopes de Sá

A maior valia de uma empresa em um dado momento depende das perspectivas de lucro que a mesma possui, apuradas com um grau de confiabilidade razoável.

Esse acréscimo como potencialidade que é, quando tem valor de negociação, ou seja, quando se transforma em uma valia maior, tem natureza intangível; como matéria patrimonial é, por isto, também, de natureza contábil quanto aos estudos e práticas pertinentes.

Sendo vários os fatores que formam a capacidade “imaterial” referida, para determiná-la são utilizados meios técnicos, pois, sobre a questão já existe razoável sustentação doutrinária.
Cálculos se fazem, então, para apurar um “fluxo do lucro” (que não é fluxo de caixa como inadequadamente alguns denominam) e neste inclui-se, como fator redutor, margem razoável de risco que vai desde a da probabilidade próxima até a de natureza remota.

Com base no fluxo referido alguns técnicos traçam uma projeção do capital próprio da empresa, ou seja, uma demonstração sobre a “viabilidade de crescimento do valor” por efeito de “capitalização”.

Realizam-se nos demonstrativos aludidos, prospecções de “lucro sobre o lucro acumulado”, seguindo a critérios que ainda não conseguiram unanimidade de opinião quanto à validade dos mesmos.

Tal metodologia, entretanto, tem sido contestada, especialmente por estabelecer um rigor impertinente.

Célebre tratadista da questão, o mestre Giovanni Ferrero, em sua obra “La valutazione economica del capitale di impresa”, recusou enfaticamente tal forma de raciocinar e afirmou categoricamente que a capitalização é infundada e inaceitável, a não ser em casos raros em que o lucro futuro esteja de fato garantido, sem possibilidade alguma de reversão.

Sofisticações sobre a incerteza acabam por ser “incertezas de incertezas”, ou seja, potencializam-se.

O crescimento do capital próprio, quando previsto com margem de segurança razoável justifica, indubitavelmente, em um presente, uma “maior valia”, mas, exige cautela.

A imprudência decorrente de euforias bursáteis não encontra apoio na tecnologia contábil que se fundamenta em realidade objetiva.

Cabe acrescentar, ainda, que as análises, na atualidade, esbarram na falta de confiança que está a existir em relação aos balanços, ou seja, a “análise externa” não está inspirando segurança.
A debilidade cultural do sistema normativo tem agasalhado falsidade e esta a crises.

Os demonstrativos elaborados em bases das normatizações denominadas como “internacionais” jogaram por terra o critério de certeza, este que sempre foi ferrenhamente defendido; o acolhimento da “volatilidade”, apoiado em critérios subjetivos, sujeitos a flexibilidades mal utilizáveis, deu vitória ao empirismo e o resultado está ai bem expressivo.

A crise atual bem responde pela falta de sinceridade existente e que hoje em nosso País está acobertada pela lei 11.638/07, com a consagração de metodologia que se evidenciou fracassada e agasalhadora de falsidade; fossem sinceros os balanços e não existiriam investimentos equivocados e não houvessem estes e não haveria a crise.

A projeção, pois, de lucros futuros, de intangíveis fantasiosos, do referido “fluxo” depende, pois, para que possa ser acolhida, da sinceridade informativa; muitos problemas ainda ocorrerão, entretanto, enquanto for ensejada a manipulação dos ajustes “voláteis” das contas através de Normas Contábeis.

SONAMBULISMO CONTÁBIL

*Marcelo Henrique da Silva – Abril/2009

Para muitos, a discussão sobre a obrigatoriedade de todas as empresas adotarem o Novo Padrão Contábil – NPC estaria superada no debate dogmático e não teria qualquer utilidade no presente. Isso tudo em decorrência do comando contido na Resolução CFC nº 1.159/09 (item 2).

Mas, agindo assim, esquecem que esta dista de ser uma questão meramente acadêmica. Na sua base, encontram-se todas as perplexidades sobre o relacionamento entre as normas de direito e as administrativas, que se vão refletir na própria aplicação obrigatória ou não do NPC.

Como se sabe, as Resoluções do Conselho de Contabilidade são atos inferiores a Lei, não podendo contrariá-la, restringi-la ou ampliá-la, uma vez que o ordenamento jurídico pátrio não permite que atos normativos infralegais inovem originalmente o sistema jurídico, conforme decisão do TRF-4ª.

Somente a Lei, e não a autoridade administrativa, poderá criar, extinguir ou alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas do direito.

A interpretação das normas jurídicas que tenham como hipótese a incidência jurídica do NPC, para fins de constituição de obrigação, exige, inexoravelmente, uma interpretação do texto legal que se pretenda aplicar e, bem assim, das normas de direito vigentes no país.

Durante muito tempo, a contabilidade foi quase que exclusivamente a Lei nº 6.404/76. A lei contábil!

A Lei das S/A aplicável também as demais sociedades (ah! o Manual ...) seguiu sendo aplicada até a entrada em vigor do novo Código Civil Brasileiro.
Como a tradição (costume?) não se vence tão facilmente, a manutenção-aplicação da Lei das S/A (lei contábil?) continua a aprisionar.

Escravos libertos!

Mesmo depois da Lei Áurea Contábil, refiro-me ao novo Código Civil, muitos continuam aplicando às LIMITADAS o modus operandi da Lei das S/A, mesmo naquilo que foi derrogada. Costume!?

É interessante observar que o fim da escravidão no Brasil não foi sinônimo de liberdade. Não para os negros. Apesar da alforria, o trabalho e as condições de sobrevivência mantiveram-se. Continuavam sobre o julgo dos poderosos, mas não só destes, como também de vozes mais cultas, como as de cientistas, pesquisadores e historiadores.

Na atualidade, o contador contábil continua fazendo contabilidade como sempre fez, como lhe ensinaram na faculdade, como estava no Manual, repetindo informações, sem a superação do tradicionalismo que impregna a mente dos Senhores de Escravos.

Juridicamente, é no novo Código Civil, não na Lei das S/A, que se encontra a incidência obrigacional da contabilidade para as sociedades LIMITADAS.

Para comprovar esse entendimento, apenas quanto à incidência jurídica constar do Código Civil e não da Lei das S/A, trago excerto do Manual de Fiscalização do Conselho de Contabilidade (CFC).
No item 1 deste Manual temos a questão: Por que a contabilidade é obrigatória em todas as empresas? Resposta do Manual: Por exigência legal do Novo Código Civil.

Está lá, no Manual de Fiscalização, elaborado com a intenção de conscientizar, permanentemente, os contabilistas para o melhor cumprimento do seu dever profissional e, ainda, pretendendo minimizar o número de autuações.

Para o cumprimento do dever profissional, esclarecendo o contador, o Manual faz constar que:

a) o empresário e a sociedade empresária são obrigados a seguir um sistema de Contabilidade e levantar, anualmente, o Balanço Patrimonial (nos termos do art. 1.179 do Código Civil Brasileiro); b) Os artigos 1.180 e 1.181 do novo Código Civil brasileiro determinam a obrigatoriedade da autenticação do Livro Diário no órgão de registro competente;
c) Portanto, a partir do novo Código, não existe mais dúvida sobre a obrigatoriedade de todos os empresários e as sociedades empresárias manterem sua escrituração contábil regular, especialmente em atendimento ao que estabelece o artigo 1.078, quanto à prestação de contas e deliberação sobre o balanço patrimonial e a demonstração de resultado, cuja ata deverá atender ao que prevê o artigo 1.075, para ser arquivada e averbada na Junta Comercial.

Nesse desvelamento de posição do Conselho de Contabilidade, em consonância com as normas jurídicas positivadas, descortina-se o contexto do texto do item 2 da Resolução CFC nº 1.159/09.

Por certo, a carência de normas jurídicas obrigando todas as empresas a adotarem o NPC fez com que os Doutores da Lei buscassem no item 2 da Resolução CFC nº 1.159/09 a fonte material de uma obrigação não constante de lei.

Consta da Resolução CFC nº 1.159/09, item 2, que “as definições da Lei nº 11.638/07 e da MP nº 449/08 devem ser observadas por todas as empresas obrigadas a obedecer à Lei das S/A, compreendendo não só as sociedades por ações, mas também as demais empresas, inclusive as constituídas sob a forma de limitadas, independentemente da sistemática de tributação por elas adotada”.

Numa leitura apressada, superficial, os Eruditos concluíram que o NPC deve ser aplicado a todas as sociedades limitadas independentemente da sistemática de tributação. É isto que está escrito no item 2 da Resolução. E ponto! Essa é a leitura certa!

Essa conclusão, aliás, é a que, infelizmente, predomina numa inteligência unidimensional.
Parafraseando o estadista francês que disse durante a primeira guerra mundial que a guerra é um processo sério demais para ser deixado na mão dos militares, ouso dizer que a contabilidade é um processo sério demais para ser deixado na mão dos Doutores da lei.

Circunstâncias históricas ajudam a explicar o verdadeiro conteúdo do item 2 da Resolução CFC nº 1.159/09.

De início, como visto acima o Manual de Fiscalização do CFC estabelece que a contabilidade e as demonstrações contábeis das empresas LIMITADAS decorrem da exigência legal do Novo Código Civil.

O Manual esclarece, vale relembrar, que a sociedade empresária são obrigados a seguir um sistema de Contabilidade e levantar, anualmente, o Balanço Patrimonial, nos termos do art. 1.179 do novo Código Civil.

Sendo obrigadas a possuir contabilidade e levantar demonstrações contábeis nos termos do novo Código Civil, não são obrigadas a seguir os comandos da Lei das S/A. É óbvio! Isso é o que consta do Manual.

E detalhe, isso tudo está lá no Manual de Fiscalização do CFC, de forma legível!
Noutro momento, no Livro Escrituração contábil simplificada para micro e pequena empresa, chancelado pelo Conselho de Contabilidade, destaca-se que o contabilista deve executar a escrituração contábil e elaborar as demonstrações contábeis da empresa contratante nos termos das disposições vigentes, máxime em atendimento ao disposto no art. 1.179 do Código Civil Brasileiro, Lei nº 10.406/02, segundo o qual, todo empresário ou sociedade empresária está obrigado a adotar e a seguir um sistema de contabilidade. E conclui que essa obrigação aplica-se indistintamente às empresas tributadas pelo Lucro Real, Lucro Presumido, Lucro Arbitrado ou pelas regras do Simples Nacional.

Novo-velho detalhe, isso está lá no site do CFC, de forma legível!

Por seu turno, a Câmara Técnica do Conselho Federal de Contabilidade estabeleceu, no Parecer CT/CFC nº 24/03, que:

1) as empresas constituídas sob a forma de sociedades por ações (sociedades anônimas ou comandita por ações) são obrigadas, de acordo com o art. 176 da Lei das S/A, a elaborar, com base na escrituração mercantil, ao final de cada exercício social, as suas demonstrações contábeis; 2) as empresas constituídas sob a forma de sociedades limitadas atualmente são reguladas pela Lei nº 10.406 de 11 de janeiro de 2002 (Novo Código Civil), onde se estabelece que as demonstrações contábeis devem ser elaboradas anualmente.

Sendo reguladas pelo novo Código Civil, refiro-me às LIMITADAS, é neste que se encontra a obrigação jurídica da elaboração, com base na escrituração mercantil, ao final de cada exercício social, das suas demonstrações contábeis (art. 1.179 – O empresário e a sociedade empresária são obrigados a seguir um sistema de contabilidade, mecanizado ou não, com base na escrituração uniforme de seus livros, em correspondência com a documentação respectiva, e a levantar anualmente o balanço patrimonial e o de resultado econômico).

No Parecer CT/CFC nº 99/05, a Câmara Técnica do Conselho Federal de Contabilidade, utilizando de parte de editorial do Jornal do CRC Notícias, editado pelo CRCPE, confirma que a Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, que institui o Código Civil Brasileiro, estabelece no artigo 1.179 a obrigatoriedade de o empresário e a sociedade empresária seguirem um sistema de contabilidade, com base na escrituração uniforme de seus livros, em correspondência com a documentação respectiva e a levantar anualmente o balanço patrimonial e o de resultado econômico, e da mesma forma, por força do disposto no artigo 177 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, as sociedades por ações estão obrigadas a conservarem a escrituração em registros permanentes.

Detalhe, isso tudo está disponível no site do CFC, de forma legível!

Na Resolução nº 1.157/09 o Conselho de Contabilidade estabelece que a obrigação da conta Lucros Acumulados não conter saldo positivo aplica-se unicamente às sociedades por ações, e não às demais. Ou seja, como a reserva de lucros foi suprimida da Lei nº 6.404/76 as S/A são obrigadas a destinar o lucro, mas só vale para as S/A, pois estão sujeitas a essa lei; as sociedades LIMITADAS não estão obrigadas a destinar o lucro, pois não estão obrigadas a cumprir a Lei das S/A!

Guardando vistas a estes posicionamentos (do Conselho de Contabilidade), podemos compreender o conteúdo da obrigatoriedade da escrituração e das demonstrações contábeis: i) as sociedades anônimas estão obrigadas a escriturar e levantar demonstrações contábeis em razão dos arts. 176 e 177 da Lei nº 6.404, de 1.976; ii) as sociedades LIMITADAS estão obrigadas ao cumprimento da escrituração e demonstrações contábeis em decorrência do Código Civil Brasileiro (art. 1.179).

Agindo assim, o contexto do texto do item 2 da Resolução CFC nº 1.159/09 ganha compreensão. Por certo é preciso que o contador liberto se liberte, de fato, da tradição (ou costume) de seguir a Lei nº 6.404/76. Tradição essa desprovida de fundamentação jurídica, diga-se de passagem.
À distância, o “item 2” dá a impressão de novidade, mas, numa melhor aproximação, vê-se, de plano, que há coerência lógica e histórica.

Vejamos a primeira parte do referido artigo: as definições da Lei nº 11.638/07 e da MP nº 449/08 devem ser observadas por todas as empresas obrigadas a obedecer à Lei das S/A.
OK! Mas quem são as empresas obrigadas a obedecer a Lei das S/A?

Como se viu, o Conselho de Contabilidade orienta, explica, fiscaliza e decide no sentido de que as empresas S/A estão obrigadas a seguir a Lei das S/A (enquanto que as LIMITADAS estão sujeitas ao novo Código Civil – é assim a posição do Conselho de Contabilidade).

OK! Mas e a segunda parte do artigo em análise que descreve: “...compreendendo não só as sociedades por ações, mas também as demais empresas, inclusive as constituídas sob a forma de limitadas, independentemente da sistemática de tributação por elas adotada”.

Estamos num momento de conflito imperativo, poderia uma norma administrativa obrigar algo não previsto em lei? Por certo não!

Então, neste momento vemos a repercussão jurídica do art. 3º da Lei nº 11.638/07 no item 2 da Resolução em análise, ao prescrever (a Lei) que “aplicam-se às sociedades de grande porte, ainda que não constituídas sob a forma de sociedades por ações, as disposições da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, sobre escrituração e elaboração de demonstrações financeiras e a obrigatoriedade de auditoria independente por auditor registrado na Comissão de Valores Mobiliários”.

Ora, a segunda parte do item 2 da Resolução CFC nº 1.159/09 é a representação administrativa deste art. 3º da Lei nº 11.638/07, em consonância com o histórico posicionamento do Conselho de Contabilidade.

Observando com maior acuidade, e ordenando do raciocínio aplicado ao item 2 da Resolução CFC nº 1.159/09, temos que:

a) as definições da Lei nº 11.638/07 e da MP nº 449/08 devem ser observadas pelas empresas S/A, pois estão obrigadas a obedecer à Lei nº 6.404/76; e
b) as definições da Lei nº 11.638/07 e da MP nº 449/08 também devem ser observadas pelas sociedades de grande porte, ainda que não constituídas sob a forma de sociedades por ações (conforme determina o art. 3º da Lei nº 11.638/07), independentemente da sistemática de tributação por elas adotada.

Em outras palavras, “as definições da Lei nº 11.638/07 e da MP nº 449/08 devem ser observadas por todas as empresas obrigadas a obedecer à Lei das S/A (no caso as sociedades anônimas), compreendendo não só as sociedades por ações, mas também as demais empresas (desde que DE GRANDE PORTE), inclusive as constituídas sob a forma de limitadas, independentemente da sistemática de tributação por elas adotada (as DE GRANDE PORTE).
Essa composição de fatores histórico e teórico encontram a realidade jurídica forjada na Resolução do CFC. Qual seja, o “item 2” não manda aplicar o NPC a todas as sociedades limitadas independentemente da sistemática de tributação, até porque não poderia criar esta obrigação não contida em lei.

A adoção da reserva de lei para criação de obrigação, constante da Carta Magna, conjugada com o art. 3º da Lei nº 11.638/07, controla a extensão prescricional do item 2 da Resolução CFC nº 1.159/09. Assim, como a Lei não criou a obrigação da adoção do NPC a todas as sociedades, não caberia a uma Resolução essa função.

Captando os valores jurídicos envolvidos no item 2 da Resolução CFC nº 1.159/09, a propósito de uma regra de identificação do dever-ser, e dentro da relação de pertinencialidade da norma dentro do sistema normativo, a conduta descrita na Resolução restringe-se às SOCIEDADES ANÔNIMAS e aquelas DE GRANDE PORTE (mesmo que constituídas na forma de LIMITADAS), esta última independentemente da sistemática de tributação adotada.

Desse modo, a sacada dos Doutores da lei não se sustenta (mais um vez), pelos poucos e simples motivos arrolados. Agora, só mesmo com a Teoria do Medo (sic)!

Postas estas considerações gerais, cumpre advertir, tomando de empréstimo as palavras do magistral Fernando Pessoa: Nenhum de meus escritos foi concluído; sempre se interpuseram novos pensamentos, associações de idéias extraordinárias, impossíveis de excluir, com o infinito como limite. Não consigo evitar a aversão que tem o meu pensamento ao ato de acabar.

*Marcelo Henrique da Silva, é contador em Londrina.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Mandado de Segurança - Sistema Tributário Nacional

Decisão proferida pelo STF no Mandado de Segurança nº 27.931-1/DF: relevantes efeitos no Sistema Tributário Nacional

Daniel Prochalski
Advogado sócio da João Paulo Nascimento & Associados - Advogados e Consultores. Especialista em Direito Tributário pela PUC-PR. Mestre em Direito Empresarial e Econômico pelo Centro Universitário Curitiba. Professor de Direito Tributário no CESCAGE - Centro de Ensino Superior dos Campos Gerais


Como foi amplamente veiculado na mídia, o presidente da Câmara dos Deputados, Deputado Michel Temer (PMDB-SP), proferiu decisão pela qual as Medidas Provisórias (MPs) apenas trancarão a pauta da Casa em relação às matérias reservadas pela Constituição às leis ordinárias.

Ou seja, de acordo com a decisão de Temer, os deputados ficam livres para votar, em sessões extraordinárias da Casa, matérias contidas em propostas de emenda à Constituição, resoluções e leis complementares, uma vez que, por não serem reservadas às leis ordinárias, pode ser objeto das MPs.

Com efeito, estas matérias devem ser analisadas pelos deputados nas sessões ordinárias, as quais ocorrem entre terça e quinta-feira no Plenário da Câmara. Registre-se que, no modelo atual, as MPs trancam a pauta de votações da Câmara e do Senado após 45 dias de tramitação, o que impede a análise de todas as outras matérias relevantes para o país.

Contra a decisão de Temer, foi impetrado um mandado de segurança no STF (MS nº 27.931-1/DF) pelos líderes Fernando Coruja (PPS-SC), Ronaldo Caiado (DEM-GO), e José Aníbal (PSDB-SP). Estes parlamentares alegam que o trancamento da pauta pelo excesso de medidas provisórias é um problema que precisa ser solucionado, mas que a proposta apresentada por Temer não resolveria a questão. O mandado de segurança foi distribuído à relatoria do ministro Celso de Mello, o qual manteve, no dia 27/03/2009, a decisão do presidente da Câmara, indeferindo, portanto, o pedido de liminar feito pelos impetrantes.

Segundo o ministro, o entendimento de Michel Temer “teria, aparentemente, a virtude de fazer instaurar, no âmbito da Câmara dos Deputados, verdadeira práxis libertadora do desempenho da função primária que, histórica e institucionalmente, sempre lhe pertenceu: a função de legislar”, e que esta solução está “apoiada em estrita construção de ordem jurídica, cujos fundamentos repousam no postulado da separação de poderes”.

A decisão do ministro Celso de Mello, embora em sede provisória, nos traz verdadeiro alento democrático, diante do excesso de medidas provisórias editadas pelos sucessivos presidentes da República, “transformando a prática extraordinária dessa competência normativa primária em exercício ordinário do poder de legislar, com grave comprometimento do postulado constitucional da separação dos poderes”, conforme as palavras do próprio relator.

Ao final da decisão, após a tradicional solicitação de informações à autoridade dita coatora, o ministro Celso de Mello pediu ao presidente da Câmara que ele identifique, discriminando-as, “as medidas provisórias, que, ora em tramitação na Câmara dos Deputados, acham-se na situação a que se refere o § 6º do art. 62 da Constituição”, ou seja, todas as que devem ser analisadas em regime de urgência. Posteriormente, após o envio destas informações, o mandado de segurança terá sua decisão final pelo Plenário do STF.

Como é sabido, existe uma grande quantidade de projetos aguardando discussão no Congresso Nacional, que tratam de matérias essenciais ao desenvolvimento do país. Um exemplo claro são as propostas de emendas constitucionais que alteram o sistema tributário nacional (“reforma tributária”), que há anos se arrastam no Congresso Nacional sem expectativa de solução. Por outro lado, é de se lembrar que as matérias de direito tributário e financeiro de âmbito nacional são reservadas às leis complementares, por força do que dispõe os artigos 146 e 163 da Constituição Federal.

Ora, não é preciso muito raciocínio para entender que a grande quantidade de medidas provisórias editadas pelo Presidente da República dificulta ou até mesmo impossibilita que estes importantes projetos possam ser apreciados e, um dia, transformados em direito positivo brasileiro. Mas agora, com a decisão do STF, o Congresso Nacional não poderá mais invocar a desculpa conveniente de que o Poder Executivo é o único responsável pela não aprovação de matérias essenciais ao desenvolvimento econômico do país, bem como à segurança jurídica dos cidadãos (em especial, os contribuintes). Já passou da hora dos representantes do povo cumprirem a função para a qual foram eleitos e pela qual são muito bem remunerados!

Espera-se que a decisão final do STF seja pela improcedência total deste mandado de segurança, para que possamos ver e viver uma nova fase na democracia representativa do Estado brasileiro.

http://docs.google.com/Doc?id=df8zwdd_207gdfrns47

O GRANDE PROFESSOR PORTUGUÊS

MARTIM NOEL MONTEIRO (1916-1980): O GRANDE PROFESSOR PORTUGUÊS
Por Rodrigo Antonio Chaves da Silva


“No homem é a alma que vive com ele e é já ele./ Nos deuses tem o mesmo tamanho/ e o mesmo espaço que o corpo/ e é a mesma coisa que o corpo/ Por isso dizem que os deuses nunca morrem.” – Fernando Pessoa – Alberto Caeiro. II. Poemas inconjuntos - (2006, p. 78.)


Resumo
O objetivo deste trabalho é desenvolver missivas e relatos sobre a história de um dos professores de destaque em Portugal que foi Martim Noel Monteiro. A justificativa deste trabalho se encontra nos poucos empenhos em se traduzir relatos sobre quem foi o aludido mestre, sua vida, sua obra, tal como a sua importância não só para o solo português, nas letras contábeis, mas, para o mundo da contabilidade. É relevante a abordagem histórica em contabilidade, ainda mais em se tratando de nomes para fazer com que os atuais contadores percebam quem foi singular na história da contabilidade, assim absorvendo suas idéias e imitando os seus exemplos. Portanto, não pode ficar por apagada a história de Monteiro, visto que, o método histórico trata não apenas do passado, mas do registro de nomes e cientistas, pois, uma ciência se forma com as verdades que se externam pelas inteligências, assim impossível seria tratar da contabilidade sem considerar igualmente os seus heróis e conquistadores do seu conhecimento permitido por Deus.

Palavras-chaves: Martim Noel Monteiro – Vida e obra – contribuição para a contabilidade.

Leia o artigo completo clicando aqui.

Rodrigo Antonio Chaves da Silva: Contador, perito contábil, professor de contabilidade geral, comercial e técnica comercial da Associação Comunitária Raulsoarense (ASSECRAS), e ganhador do prêmio internacional de história da contabilidade Prof. Martim Noel Monteiro edições 2007/2008 pela APOTEC (Associação Portuguesa dos Técnicos de Contabilidade); historiador, teórico da contabilidade, e especialista em gestão econômica das empresas.

O novo padrão contábil nas Limitadas

Prof. MSc. Wilson Alberto Zappa Hoog


Resumo

Apresento uma breve análise, com o registro do nosso espanto com o equívoco da Resolução CFC 1.159/09. Além de alertar para o fato da não aplicação das regras de escrituração contábil das Anônimas às Sociedades Limitadas, exceto para as Limitadas de grande porte. Logo, demonstra-se que as novas práticas contábeis adotadas no Brasil, via Resolução CFC 1.159/09, que foram inspiradas ou trazidas pela Lei nº. 11.638/07 e MP nº. 449/08 estão a desprezar as viripotentes normas do Direito de Empresa, prescritas no Código Civil.

Pois a contrario sensu está a Resolução CFC 1.159/09, que tenta inverter o modo operante, como também, demonstra-se neste artigo, que não existe a menor sombra de dúvida de que foi derrogado não só o art. 18, mas todo o Decreto 3.708 de 1919, que remetia aos registros contábeis das Limitadas e as lacunas deste Decreto, a Lei das Sociedades Anônimas. Certifico também que a Lei nº. 11.638/07 e MP nº. 449/08, não geraram no direito brasileiro o efeito de repristinação.

Palavra-chave: Novas regras de escrituração; Alterações na Lei das Sociedades Anônimas; Sociedades Limitadas; Escrituração Contábil; Aplicação às Limitadas das regras das Sociedades Anônimas.

Com relação às regras de contabilidade específica das Sociedades Anônimas, alertamos para o fato da sua não aplicação às Sociedades Limitadas, exceto para as Limitadas de grande porte. Logo, as novas práticas contábeis adotadas no Brasil, via Resolução CFC 1.159/09 que foram inspiradas ou trazidas pela Lei nº 11.638/07 e MP nº. 449/08 estão a desprezar as viripotentes normas do Direito de Empresa, prescritas no Código Civil. O epítome da Resolução CFC 1.159/09 é uma atrocidade a política contábil.

No Brasil, por determinação da Lei maior, Constituição, art. 5º - II, todas as pessoas são obrigadas a fazer ou não fazer em conformidade com a lei. Logo, os administradores das sociedades limitadas devem prestar contas nos termos da lei, e os contadores também devem elaborar os balanços das limitadas bem como a sua escrituração contábil nos termos da lei. E a lei que regula as Limitadas é a 10.406/2002, ou seja, a norma adequada é o CC/2002. Este princípio, constitucional é a rédea da política contábil nacional. Razão pela qual os pilares de desenvolvimento e sustentação tecnológica contabilísticas estão fundidos nesta verdade máxima, emergentes de nosso ordenamento jurídico. Que deve ser seguido em um estado democrático de direto.

É o princípio constitucional da legalidade, que da segurança jurídica e contábil, e nos permite afirmar que até o presente momento, 27 de março de 2009, não há qualquer força normativa que dê suporte à obrigação de adoção das normas de contabilidade das Sociedades Anônimas para todos os demais tipos de sociedades, tributadas ou não pelo Lucro Real. Até porque existe, e está pacificado o contrário nas hipóteses de omissões ou de lacuna da Lei 6.404/76 aplica-se os dispositivos do Código Civil, por força do CC/2002, art. 1.089. “A sociedade anônima rege-se por lei especial, aplicando-se-lhe, nos casos omissos, as disposições deste Código.”

A contrario sensu está à Resolução CFC 1.159/09, que tenta inverter o modo operante. Sugiro que o CFC brade aos quase 400 mil colegas a imperatividade do CC/2002 para as Sociedades Anônimas nos casos de lacuna.

Pois é condição sine qua non, com efeito, erga omnes, a supremacia de uma correta interpretação do nosso ordenamento jurídico, afastando-se interpretações ambíguas e/ou polissêmicas. Como alguns exemplos desta imperatividade, citamos: a quebra da personalidade jurídica por abuso de poder, art. 50 do CC/2002; as normalizações relativas ao estabelecimento empresarial, arts. 1.142 ao 1.149 do CC/2002; as hipóteses de autorização do poder executivo para funcionar uma Sociedade Anônima, art. 1.132 do CC/2002; as regras de escrituração do Livro Diário, arts. 1.179 ao 1.195; e as regras do Livro Balancetes Diários e Balanços, art. 1.186; e et cetera.

Usando a prerrogativa constitucional do art. 5º - IV, que versa sobre a livre manifestação do pensamento, combinado com a liberdade de cátedra, CF art. 206. Alertamos também, para o fato da não aplicação as Sociedades Limitadas, da escrituração e publicação das demonstrações financeiras nos termos do inciso XI, art. 67 do Decreto-lei nº. 1.598/77, no que diz respeito às tributadas pelo Lucro Real, com observância das disposições da Lei nº 6.404/1976. Pois validar a vigência deste dispositivo é negar a existência do Código Civil Brasileiro de 2002 e fazer prova de ignorância plena frente à Lei de Introdução ao Código Civil e demais regulamentações. A Lei de Introdução ao Código Civil, tem o espírito ou razão, de que é a regra de direito, que cuida de orientar a aplicação do Código Civil, do preenchimento de lacunas; e de regular vários fatores tais como: a vigência, a validade, a eficácia, a aplicação, a interpretação, bem como, as revogações e derrogações de normas positivas no direito brasileiro, além de trazer alguns conceitos e máximas como: o ato jurídico perfeito, a coisa julgada, o direito adquirido e o efeito repristinatório. (Decretolei nº. 4657/1942).
Pois neste Código Civil, é que as Limitadas e demais formas de se organizar a empresa, encontra-se a determinação jurídica de se fazer contabilidade, conforme o art. 1.179, o qual prescreve que as sociedades empresárias são obrigadas a possuir contabilidade, e a levantar anualmente balanço patrimonial e o de resultado econômico. Logo, as limitadas encontram-se obrigadas a manter os registros contabilísticos em decorrência do Código Civil, e não pelas normas contidas na Lei 6.404/76. O que nos leva a defender que o CC/2002, para fins de demonstrações financeiras e legislação societária, derrogou o inciso XI, art. 67 do Decreto-lei nº. 1.598/77. Tal conclusão prende-se a lógica jurídica e a aplicação do princípio da especialidade, logo, um juízo crítico de solução para suposta antinomias entre regras jurídicas. Diz-se suposta antinomia, pois o DL nº. 1.598/77 pertence ao ramo do direito tributário enquanto ao CC/2002 pertence ao ramo do direito empresarial/comercial, agora, não se pode admitir antinomia entre ramos diferentes do direito. Isto é apenas uma especulação acadêmica para a hipótese de se admitir a figura da antinomia.

Como também, não existe a menor sombra de dúvida de que foi derrogado não só o art. 18, mas todo o Decreto 3.708 de 1919, que remetia os registros contábeis e as lacunas a Lei das Sociedades Anônimas. E o art. 18 do Decreto 3.708 de 1919 não foi alvo da repristinação, por parte da Lei 11.638/07 ou da MP nº. 449/08.

Isto posto, temos a figura do unívoco, de que a Resolução CFC 1.159/09 e o inciso XI, art. 67 do Decreto-lei nº. 1.598/77, descrito como fonte de obrigação dos padrões contábeis das anônimas para as limitadas tributadas pelo Lucro Real, não é válido para determinar a forma de escrituração e publicação de suas demonstrações contábeis, bem como de seus atos e fatos, pois o Decreto 3.708 de 1919 está derrogado e a Resolução CFC 1.159/09 não tem força legislativa e muito menos competência para derrogar o CC/2002 e nem inverter o lógica jurídica instalada no país.

E por derradeiro, é no Código Civil, e não na Lei das Sociedades Anônimas, que se encontram as determinações contábeis jurídicas da contabilidade, para as limitadas e para as demais formas de se organizar a empresa. Pois as ditas novas regras contábeis, sem sombra de dúvida, aplicam-se somente as sociedades anônimas, as comanditas por ações e as tidas como de grande porte.

Data vênia, é um contra legem, o espírito da Resolução CFC 1.159, que tenta impor o novo padrão contábil a todas as entidades de fins econômicos. Os legisladores ficaram mais de 20 anos discutindo o direito civil e a sua unificação com o direito comercial, afastando a teoria dos atos e fatos de comércio, velho Código Comercial da época do império e modelo francês, para migrar para uma teoria moderna e aplicada na maioria dos países do primeiro mundo, a teoria da empresa, modelo italiano, que é uma versão melhor do direto, pautada na unificação do Código Civil com o Comercial, onde surgiu no Brasil a aplicação plena do direito de empresa.

É natural que aquelas pessoas que não compreendem a teoria da empresa, não consigam interpretar o Código Civil, e isto não quer dizer que se deva ignorar o Código, muito pelo contrário, é necessário estudá-lo e quiçá, ler um dicionário de direito de empresa, para compreender o sentido e alcance das categorias.

O saber contabilístico e filosófico do ilustre Contador Marcelo Henrique da Silva, www.netlegis.com.br, constante da revista jurídica Netlegis, consultada em 12-03-09, com o titulo “ Novo padrão Contábil, um delírio ” exprime a propriedade de uma atrocidade, nos seguintes termos: “nesse mundo, agora no nosso, alguns (ou muitos!) querem impor um novo padrão contábil —NPC a todas as sociedades brasileiras, em que pese inexistir norma jurídica dispondo nesse sentido (seria o olho cego transmitindo a cegueira?)”.

Inclusive, para fins exclusivamente de especulação acadêmica, acredito que na hipótese do judiciário ser provocado a respeito do uso indiscriminado, e da aplicação da Resolução CFC 1.159/09, quiçá, venha a deliberar no seguinte sentido: que a Resolução CFC 1.159, na determinação da aplicação das regras das Sociedades Anônimas as demais formas de se organizar a empresa, seja considerada uma apologia ao ilícito, e as demonstrações financeiras, balanço e demais peças, sejam consideradas apócrifas (sem autenticidade), putativas (que aparenta ser verdadeiro, sem o ser) e simuladas (por conter elementos de valorimetria diversos do art. 1.187 do CC/2002); logo, por não atender as determinações do CC/2002, gerando com isso responsabilidade dos administradores por uma prestação de contas equivocada, gerando a possibilidade de indenização por ato culposo, o que pode gerar uma ação de perdas, danos e lucros cessantes, arts.: 186, 1.016 e 1020 do CC/2002, com as devidas consequências ao contador, que poderá responder, inclusive com seus bens pessoais, pelos atos culposos, portanto, ilícito. Por força dos arts.: 186 e 1.177 do CC/2002. O art. 1.177 trata especificamente dos erros e da culpa dos profissionais da contabilidade. E lembramos que é defeso ao profissional da contabilidade alegar ignorância ao Código Civil em defesa de seus atos tidos como culposos, ou seja, do ilícito, por força do art. 3º do Decreto-lei 4.657/42. E ainda se estas diferenças de critérios de valorimetria, Lei 6.404/76 em relação ao CC/2002, causarem danos a credores, é um crime, vide Lei 11.101/05, art. 168, §1º: I e II, pela elaboração de escrituração contábil ou balanço com dados inexatos; ou por omitir na escrituração contábil ou no balanço, lançamentos que deles deveria constar, ou alterar escrituração ou balanços verdadeiros. Os danos, ainda que somente de forma moral, geram a obrigação de indenizar.

Este conflito com as leis confunde os estudantes e iniciantes, além de atrapalhar a compreensão do desenvolvimento da política contábil brasileira. Pois a aquisição da racionalidade lógica contabilística tem sido um longo esforço dos contadores brasileiros para a inclusão e permanente desenvolvimento do saber científico. Pelo menos o de interpretar as leis sem deformar o razão da lei, ratio legis, está em nossas mãos. E é parte do nosso labor.

O profissional da contabilidade deve compreender as leis relativas ao direto de empresa, por uma interpretação literal, lógica e semântica, em que busca explicar e aplicar uma norma contabilística conforme o bom senso, de forma coerente e racional que resulta, inevitavelmente, de uma dada situação, ou de um fato. Como por exemplo: a ratio legis, ou seja, a razão ou o motivo que justifica esta norma, a eficácia objetiva da norma e a circunstância da sua criação e aplicação, em um contexto geral, considerando todo o ordenamento jurídico e não apenas a norma em si. Não se trata de acrescentar ou omitir coisas ou situações, mas sim, da independência e imparcialidade do intérprete, para atribuir á norma o significado, sentido e alcance exato. Sem benefícios, malefícios ou qualquer tipo de influência ou juízo de valor político.

A TEORIA DO MEDO, A “BOMBA INTELIGENTE” DO NOVO PADRÃO CONTÁBIL

*Marcelo Henrique da Silva – Abril/2009

Como falta tempo para pensar e tranqüilidade no pensar, as pessoas querem as respostas. Já! Prontas! Praticidade! Tempo! Resumo! Fast Food!

Neste caso, perdem as idéias escondidas nos silêncios que há entre as palavras.

O tema apresentado, felizmente, não comporta nenhuma resposta, que dirá algo pronta.

Creio ser importante situar a figura da Teoria do Medo no contexto do texto. Isto é muito importante... Então vamos!

A comunidade étnica dos Mandeanos, pouco conhecida entre nós, é um grupo gnóstico que sobreviveu em todo mundo, e chegou intocado ao século XXI. Durante dois milênios, eles mantiveram seus hábitos, suas cerimônias, seus textos, seu isolamento, sua religião. Os Mandeanos ocupam desde o primeiro século a divisa do Iraque com o Irã.

A invasão do Iraque pelos norte-americanos acirrou a guerra civil e os ódios internos, arremessando Sunitas contra Xiitas, o que, infelizmente, não poupou os Mandeanos. Estes grupos internos, no poder, convidam os Mandeanos a se converter ao Islã, a seu modo: ou aceitam o Islã ou morrem!

Em Bagdá, um panfleto dirigido aos Mandeanos continha a seguinte frase inicial: “Ou vocês abraçam o Islã e desfrutam conosco de segurança e coexistência, ou saem de vez de nossas terras. Do contrário, a espada será o juiz que distinguirá entre a fé e a blasfêmia”.

Os fragmentos acima apresentam aquilo que considero a Teoria do Medo, onde ou aceitam a minha verdade ou sentirão a força da minha espada, serão castigados sem piedade!

E o que tudo isso tem a ver com o Novo Padrão Contábil – NPC?

Nesse momento, tudo. Explico!

No universo contábil, mas numa escala insignificantemente menor, a Teoria do Medo começa a despontar. O aviso, em alguns casos é subliminar (mas que existe, ah! ele existe), noutros é explícito (impresso em papel nobre, em negrito), e corresponde à: “...ou aderem ao Novo Padrão Contábil – NPC ou serão multados [pelo Conselho de Contabilidade] ...”.

Na falta de argumentos, a espada, o castigo sem perdão! Ou aceitam e aplicam o NPC a todas as sociedades ou serão multados (lavaremos com sangue a honra)!

A verdade destes poucos (ou muitos?) é uma só, sendo o NPC obrigatório para todas as empresas (sic), a sua não aplicação implicaria em desobediência aos comandos normativos do Conselho de Contabilidade.

Mas afinal, quanto há de verdade verdadeira (o pleonasmo é intencional) neste incauto aviso?

Legalmente, nenhuma!

Mas o estrago feito é devastador, ao estilo do bombardeiro Enola Gay. A Teoria do Medo, indiscutivelmente, é eficaz. A bomba foi inteligente!

Ocorre que essa inteligência é unidimensional (ou seria umbigal?), não suporta uma análise do Poder Judiciário.

Explico, mas advirto que o NPC não é aplicável a todas as sociedades, para isso basta ver as opiniões balizadas dos ícones Lopes de Sá e Zappa Hoog (é só digitar no Google...).

O Código Civil Brasileiro, de 2002, prescreve em seu art. 1.190 que ressalvados os casos previstos em LEI, nenhuma autoridade, juiz ou tribunal, sob qualquer pretexto, poderá fazer ou ordenar diligência para verificar se o empresário ou a sociedade empresária observam, ou não, em seus livros e fichas, as formalidades prescritas em LEI.

Logo, os livros e demonstrações contábeis do empresário e da sociedade empresária só podem ser apresentados a terceiros quando houver previsão legal, anotando que Resolução não é LEI. Nenhuma autoridade, juiz ou tribunal, sob qualquer pretexto, poderá fazer ou ordenar diligência a esses livros e demonstrações, exceção se autorizados por LEI.

Caso específico desta obrigação, de apresentar, é a prescrição contida no art. 1.193 daquele mesmo código, onde as autoridades fazendárias, no exercício da fiscalização do pagamento de impostos, podem requerer os tais livros e demonstrações.

Desta feita, a partir da leitura destes enunciados, são desacortinadas questões polêmicas, sobretudo de cunho fiscalizatório, que, como se verá, carece de estudo e aprofundamento doutrinário, servindo estas linhas como elemento revelador e impulsionador de subseqüentes incursões científicas a fim de enfrentar, melhor abalizar e, quiçá, unificar e pacificar o tema.

A primeira indagação, ainda não superada, os livros e demonstrações contábeis podem ser objeto de fiscalização por parte do Conselho de Contabilidade, para fins de verificar se o empresário ou a sociedade empresária observam, ou não, em seus livros e fichas, as formalidades prescritas em LEI?

Outro ponto, ainda não enfrentado, os livros e demonstrações contábeis do empresário ou da sociedade empresária devem ser fornecidos ao Conselho de Contabilidade pelo contador?

Questão de fundo, os livros e demonstrações contábeis do empresário ou da sociedade empresária não apresentados ao Conselho de Contabilidade geram multas-penalidades ao profissional contábil?

Impulsionando o tema, vale a advertência de Edgar Morin, onde o conhecimento unidimensional, se cega outras dimensões da realidade, pode causar cegueira. Em outras palavras, uma visão da contabilidade que observasse na contabilidade apenas as resoluções do Conselho de Contabilidade, por exemplo, seria unidimensional, esquecendo as normas gerais de direito.

Por certo, cada um destes temas comporta amplo exame, por envolver múltiplas facetas e ensejar distintas teorias. Nesta oportunidade, examinarei o que de mais relevante se apresenta.

De pronto vale destacar a decisão do TRF-1ª, ao confirmar que do Conselho de Contabilidade “as resoluções, como atos infralegais que são, não se prestam a impor comportamentos não disciplinado por lei, haja vista a função do ato administrativo restringir-se a complementar esta, de modo a permitir sua concreção”.

Vale anotar, as resoluções do Conselho de Contabilidade não podem impor comportamentos não previstos em LEI, em consonância com o comando constitucional vigente, onde ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer senão em virtude de LEI.

A ação fiscalizadora do Conselho de Contabilidade tem supedâneo do art. 10 do Decreto-lei nº 9.295/46, que diz ser atribuição do Conselho de Contabilidade “fiscalizar o exercício das profissões de contador e guarda-livros, impedindo e punindo as infrações, e, bem assim, enviando às autoridades competentes minuciosos e documentados relatórios sobre fatos que apurarem, e cuja solução ou repressão não seja de sua alçada”.

Como se viu alhures, as resoluções do Conselho de Contabilidade não são normas legais capazes de impor obrigações de fazer ou deixar de fazer, a quem quer que seja, desde que não disciplinado por lei.

A questão, então, reside em saber até onde alcança o limite da competência do Conselho de Contabilidade, a quem compete efetuar o registro dos contabilistas e fiscalizar o exercício da profissão contábil.

Com a palavra o Poder Judiciário, a quem cabe, em última instância, dar efetividade às normas jurídicas.

O TRF-4ª decidiu que “inexiste amparo legal no Decreto-lei nº 9.295/46, que cria o Conselho Federal de Contabilidade, define as atribuições do Contador e do Guarda-livros, para obrigar o autor/fiscalizado a fornecer ao Conselho de Contabilidade rol de clientes para os quais presta serviços na área”.

É preciso anotar, o contador havia sido autuado pelo Conselho de Contabilidade por não apresentar relação de clientes para os quais presta serviços profissionais (sic).

Neste ponto, a resolução do Conselho de Contabilidade que impõe a obrigação de apresentação daquela relação é peremptoriamente ilegal, contraria a lei. Não vale, não pode impor nada a ninguém.

Mais adiante, decidiu o TRF-5ª que “a competência para o exame dos livros e documentação comerciais foge ao âmbito dos fiscais do Conselho Regional de Contabilidade”.

Veja que não foi negado o direito do Conselho de Contabilidade de fiscalizar. Ocorre que este não tem competência, segundo a decisão judicial, para requerer e verificar, de quem quer que seja (contador ou empresário), se o empresário ou a sociedade empresária observam, ou não, em seus livros e fichas, as formalidades contábeis prescritas em LEI.

O Código Civil Brasileiro regula a exibição dos livros e demonstrações contábeis, do empresário ou da sociedade empresária, somente nos casos previstos em LEI ou administrativamente para as autoridades fazendárias.

A exigência da apresentação de livros e demonstrações contábeis, substanciada em resolução do Conselho de Contabilidade, é terminantemente ilegal. Não vale num “estado democrático de direito” (art. 1º da CF/88).

Em suma, o Conselho de Contabilidade não pode exigir do contador, do empresário ou das sociedades empresárias a apresentação dos livros e demonstrações contábeis, para verificar se se observam, ou não as formalidades contábeis prescritas em LEI. Isso em respeito ao Princípio da Legalidade e da Segurança Jurídica, nada mais!

Fica evidente que a ação fiscalizadora do Conselho de Contabilidade, prescrita no Decreto-lei nº 9.295/46, restringe-se ao profissional contabilista, não alcançando o empresário ou a sociedade empresária; claro também que o Conselho de Contabilidade carece de competência para requer dos profissionais contabilistas os livros e demonstrações contábeis do empresário ou da sociedade empresária. Tudo isso decidido pelo Poder Judiciário.

Daí a conclusão nítida, e óbvia, de reconhecer que inexiste possibilidade de multa-penalidade aos profissionais da área contábil que não seguirem o solúvel Novo Padrão Contábil – NPC.

Não está se propondo uma anarquia contábil; nem mesmo limitando o louvável poder fiscalizatório do Conselho de Contabilidade. Está se suplicando, apenas, respeito às normas jurídicas (não confundir com Lei) de um país, no caso o Brasil!

O direito, sabemos, é um fenômeno complexo. Mas não há texto sem contexto, visto que a compreensão da mensagem pressupõe necessariamente uma série de associações que poderíamos referir como lingüística e extralingüística.

Por certo, estamos acostumados a fornecer livros e demonstrações contábeis ao Conselho de Contabilidade. Este costume, infelizmente, é a porta de entrada da Teoria do Medo.

Como bem advertiu George Lewes, este costume incessantemente repetido acaba se tornando convicção e ossificando os órgãos da inteligência.

Para os efeitos que pretendo, importa discernir o texto unidimensional das resoluções com o plano do conteúdo, do contexto das normas jurídicas.

Vale advertir, esse costume não é fonte de direito! O Conselho de Contabilidade não possui competência legal para requer dos profissionais da contabilidade, dos empresários ou das sociedades empresárias, os livros e demonstrações contábeis.

Quanto a literalidade das letras impressas num papel (mesmo que em papel nobre, m negrito), cuidado, o livro Bíblico de Levítico (25:44) estabelece que podemos possuir escravos, tanto homens quanto mulheres, desde que sejam adquiridos de países vizinhos.

Marcelo Henrique da Silva, contador em Londrina.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Decisão proferida pelo STF no Mandado de Segurança nº 27.931-1/DF: relevantes efeitos no Sistema Tributário Nacional

Daniel Prochalski
Advogado sócio da João Paulo Nascimento & Associados - Advogados e Consultores. Especialista em Direito Tributário pela PUC-PR. Mestre em Direito Empresarial e Econômico pelo Centro Universitário Curitiba. Professor de Direito Tributário no CESCAGE - Centro de Ensino Superior dos Campos Gerais



Como foi amplamente veiculado na mídia, o presidente da Câmara dos Deputados, Deputado Michel Temer (PMDB-SP), proferiu decisão pela qual as Medidas Provisórias (MPs) apenas trancarão a pauta da Casa em relação às matérias reservadas pela Constituição às leis ordinárias.

Ou seja, de acordo com a decisão de Temer, os deputados ficam livres para votar, em sessões extraordinárias da Casa, matérias contidas em propostas de emenda à Constituição, resoluções e leis complementares, uma vez que, por não serem reservadas às leis ordinárias, pode ser objeto das MPs.

Com efeito, estas matérias devem ser analisadas pelos deputados nas sessões ordinárias, as quais ocorrem entre terça e quinta-feira no Plenário da Câmara. Registre-se que, no modelo atual, as MPs trancam a pauta de votações da Câmara e do Senado após 45 dias de tramitação, o que impede a análise de todas as outras matérias relevantes para o país.

Contra a decisão de Temer, foi impetrado um mandado de segurança no STF (MS nº 27.931-1/DF) pelos líderes Fernando Coruja (PPS-SC), Ronaldo Caiado (DEM-GO), e José Aníbal (PSDB-SP). Estes parlamentares alegam que o trancamento da pauta pelo excesso de medidas provisórias é um problema que precisa ser solucionado, mas que a proposta apresentada por Temer não resolveria a questão. O mandado de segurança foi distribuído à relatoria do ministro Celso de Mello, o qual manteve, no dia 27/03/2009, a decisão do presidente da Câmara, indeferindo, portanto, o pedido de liminar feito pelos impetrantes.

Segundo o ministro, o entendimento de Michel Temer “teria, aparentemente, a virtude de fazer instaurar, no âmbito da Câmara dos Deputados, verdadeira práxis libertadora do desempenho da função primária que, histórica e institucionalmente, sempre lhe pertenceu: a função de legislar”, e que esta solução está “apoiada em estrita construção de ordem jurídica, cujos fundamentos repousam no postulado da separação de poderes”.

A decisão do ministro Celso de Mello, embora em sede provisória, nos traz verdadeiro alento democrático, diante do excesso de medidas provisórias editadas pelos sucessivos presidentes da República, “transformando a prática extraordinária dessa competência normativa primária em exercício ordinário do poder de legislar, com grave comprometimento do postulado constitucional da separação dos poderes”, conforme as palavras do próprio relator.

Ao final da decisão, após a tradicional solicitação de informações à autoridade dita coatora, o ministro Celso de Mello pediu ao presidente da Câmara que ele identifique, discriminando-as, “as medidas provisórias, que, ora em tramitação na Câmara dos Deputados, acham-se na situação a que se refere o § 6º do art. 62 da Constituição”, ou seja, todas as que devem ser analisadas em regime de urgência. Posteriormente, após o envio destas informações, o mandado de segurança terá sua decisão final pelo Plenário do STF.

Como é sabido, existe uma grande quantidade de projetos aguardando discussão no Congresso Nacional, que tratam de matérias essenciais ao desenvolvimento do país. Um exemplo claro são as propostas de emendas constitucionais que alteram o sistema tributário nacional (“reforma tributária”), que há anos se arrastam no Congresso Nacional sem expectativa de solução. Por outro lado, é de se lembrar que as matérias de direito tributário e financeiro de âmbito nacional são reservadas às leis complementares, por força do que dispõe os artigos 146 e 163 da Constituição Federal.

Ora, não é preciso muito raciocínio para entender que a grande quantidade de medidas provisórias editadas pelo Presidente da República dificulta ou até mesmo impossibilita que estes importantes projetos possam ser apreciados e, um dia, transformados em direito positivo brasileiro. Mas agora, com a decisão do STF, o Congresso Nacional não poderá mais invocar a desculpa conveniente de que o Poder Executivo é o único responsável pela não aprovação de matérias essenciais ao desenvolvimento econômico do país, bem como à segurança jurídica dos cidadãos (em especial, os contribuintes). Já passou da hora dos representantes do povo cumprirem a função para a qual foram eleitos e pela qual são muito bem remunerados!

Espera-se que a decisão final do STF seja pela improcedência total deste mandado de segurança, para que possamos ver e viver uma nova fase na democracia representativa do Estado brasileiro.