sexta-feira, 16 de outubro de 2009

ÉTICA E INFORMAÇÃO CONTÁBIL

Antônio Lopes de Sá


Deveras questionável perante a Ética é a informação contábil derivada das normas denominadas como “internacionais”, estas que foram incompetentes para previamente denunciar os erros que levaram a crise mundial financeira, assim como muitos outros sérios escândalos havidos no mercado de capitais.

Impedir ao profissional a emissão de opinião própria, subordinando-o a normas que ensejam informes falaciosos é outro ponto dúbio perante a Declaração Universal dos Direitos do Homem.

PÓSMODERNIDADE E ÉTICA NOS MERCADOS

Fatos que atualmente ocorrem gravosamente atingindo a maioria dos seres em relação aos bens materiais, envolvem causas de naturezas essenciais similares, embora aparentando formas variadas.

Em decorrência os ramos do saber que se dedicam ao estudo da riqueza a serviço do homem, mesmo possuindo comum interesse quanto ao objeto de exame, necessitam considerar aspectos peculiares.

O retorno da ciência ao campo da filosofia, fato que só a partir dos fins do século XX voltou a ser considerado com seriedade, fechou um ciclo que se seccionara pela afoiteza do positivismo, desde os primórdios da revolução científica.

Lamentavelmente, na posmodernidade o conflito entre a utilidade do conhecimento para fins dignos e a aplicação deste para escopo perversamente especulativo, através do uso do poder, atingiu de forma lesiva a filosofia do comportamento humano, ou seja, a base Ética.

A soberania nos mercados se foi impondo através de um processo de dominação perversa, segundo Martin e Schumann, em muitos casos com indignidade, enquanto uma estratégia denominada “globalização” se implantou, resultando em crises financeiras mundiais; os mencionados autores, dignos de crédito como pesquisadores, doze anos antes de eclodir a crise mundial financeira, com rigor afirmavam que: “O segmento de ações e renda variável, incensado por economistas que vêm o mercado como tribunal financeiro mundial, emite julgamentos injustos, não respeita lei alguma e produz caos econômico em vez de justiça” (obra identificada na Bibliografia, página 103).

A facilidade com que a mídia impressiona as pessoas influi na opinião popular; a maioria dos indivíduos tende a crer em tudo o que pelos sentidos absorve através do veiculado pelo rádio, televisão, revistas e jornais; em razão disso os que ambicionam extrair proveitos se utilizam do referido veículo como instrumento para conquistar a confiança de terceiros, mesmo diante de propósitos desonestos; segundo as neurociências e os estudos de filosofia do comportamento, grande parte de nossos atos se processa por imitação, desde a infância; quando algo impressiona a certo número de pessoas é natural que venha a ampliar a influência em progressão geométrica crescente; assim a informação subliminar, preparada por técnicos, realiza efeitos miraculosos, chegando a realizar fatos antes considerados impossíveis, mudando, inclusive o destino de nações; é possível mesmo formar uma consciência social sob determinadas circunstâncias, como o fez o Partido Trabalhista de Hitler, como ocorreu com o povo chinês que aplaudia a Mao Tse Tung, tal como impôs Ngo Dinh, mesmo diante dos bárbaros crimes contra os direitos humanos que esses perversos dirigentes praticaram.

A partir da segunda metade do século XX um forte conluio entre instrumentos de poder dominou a difusão de informações, o ensino, o movimento associativo de classes, profissionais, formando e usando uma cultura a serviço de maquinados “jogos especulativos financeiros”.

Tal cenário é o que oferece matéria de interesse das ciências da Administração, Direito, Contabilidade, Economia, Ética e Sociologia, merecendo, pois, exame interdisciplinar.

CONFIANÇA E CRÉDITO PARA DOMÍNIO DE MERCADO

A conquista do poder pelas vias da aquisição de confiança é fato incontestável; impor fidúcia é conquistar poder; muito influi, portanto, a imagem projetada, para a captação de tal crédito perante terceiros, especialmente quando dele se depende para conviver em um mercado.

Como crédito é confiança, as instituições do gênero, as grandes companhias, buscam prioritariamente inspirá-la como fundamento na relação com os clientes.
Os limites, todavia, em que tais eventos se operam nem sempre são fieis aos preceitos éticos.

O poder das instituições de vulto, aquele que perante o público garante sobrevivência lucrativa ou propósito de poder, mesmo sob controle estatal, nem sempre é exercido com lisura, com a observância da verdade, esta que representa condição pétrea na formação da consciência ética.

A expressiva crise de trilhões de euros e dólares que eclodiu em 2008, com reflexos em todo o mundo, é decorrência do mau uso do poder, fragilidade do sistema de controles estatais sobre os procedimentos financeiros, falta de respeito aos objetivos sociais de bem estar dos povos; vitimou o crescimento de nações, provocou desemprego, empobreceu a muitos e só beneficiou minorias especuladoras; tal fato dispensa demonstrações em razão dos efeitos caóticos resultantes.

INFORMAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE PODER

A fim de garantir imagem perante terceiros as empresas se utilizam de instrumentos diversos; prédios suntuosos, notícias pagas que influem sobre a conquista da mídia, profissionais de mercadologia e política para realizar contatos e obter favorecimentos e, também, demonstrações contábeis.

Mostrar balanços suntuosos, ostentar grande rentabilidade, aumenta o conceito; a imagem de empresa lucrativa e prospera é instrumento para aquisição de poder.
A simples evidencia de lucros futuros desperta interesse do aplicador financeiro por um empreendimento; a singela expectativa de lucratividade excita o mercado mobiliário de valores.

O uso de “informação”, portanto, como estratégia de aparência de prosperidade é um instrumento que tem surtido resultados, posto que, em geral a vocação das pessoas é a de acreditar no que é publicado; tem tal forma de poder, também, ensejado crises e alimentado fraudes expressivas, não só em instituições financeiras, mas em grandes grupos empresariais; nesse processo merece relevo a questão da informação contábil das companhias de capital aberto principalmente.

Isso porque, por exemplo, no Brasil, a lei 11.638/07 determinou que as grandes empresas adotassem critérios contábeis referidos como internacionais; tais critérios, todavia, eram os mesmos que se tornaram absolutamente incompetentes para evitarem a grande crise financeira eclodida em 2008 e que por decorrência colaboraram ativamente com a mesma.

A referida concessão, por analogia pode ser comparada à que o governo dos Estados Unidos tem feito à especulação financeira, segundo denunciaram Shumann e Martin (obra referida na Bibliografia, página 100); tais autores, em razão das benevolências feitas, afirmaram, acidamente, que “A sujeição às diretrizes do setor financeiro torna-se um assalto à democracia” (na mesma página 100).

REGIME LEGALISTA DE DIFUSÃO DA INFORMAÇÃO CONTÁBIL

As informações egressas da escrituração contábil dos empreendimentos visam primordialmente a evidenciar situações patrimoniais e lucrativas, ensejando demonstrações tornadas públicas para que sejam livremente conhecidas e despertem interesse pelas mesmas.

Considerada a necessidade da apresentação de uma realidade válida perante terceiros, resguardando direitos, evitando a dissimulação e a fraude, tradicionalmente um “regime legalista” foi o que se tornou prevalente sobre qualquer outro.

Ou seja, desde remotos tempos, através de atos de efeito compulsório são feitas exigências no sentido de formalizar o registro de transações comerciais.

A preocupação sobre a “validade de atos perante terceiros” relativa aos “informes patrimoniais” data de cerca de 6.000 anos, segundo se comprova pela arqueologia, com relação a tábuas de argila produzidas na Suméria; as leis de Eshnunna (1825 – 1787 a.C.), anteriores ao Código Hamurabi (1700 a.C) já disciplinavam relações patrimoniais e exigiam cumprimento de determinados compromissos realizados oficialmente nos templos; tal critério foi prevalecendo, seguindo ao longo do tempo o mesmo objetivo, inclusive em civilizações de alta expressão cultural como a romana, como se infere pelos escritos de Marco Túlio Cícero (especialmente as Verrinas nas quais acusa o general de não oficializar a Contabilidade no governo da Sicilia), Plínio o Moço (nas Cartas a Trajano) e outros.

Os controles sob a tutela da “legalidade” estão, pois, documentados no curso da história; se constata, inclusive, ostensivamente, na primeira obra estampada sobre o regime das partidas dobradas em 1494, quando o autor Luca Pacioli, claramente recomendou que em Cartórios se fizessem os registros dos livros de escrituração (Capítulo III do Tratado de Cômputo e Escrituração).

Tradicional, portanto, é o regime dito “legalista” em face da informação contábil, este que em 1850 no Brasil tomou forma de maior definição quando da aprovação do Código Comercial, embora embrionária; existiram anteriormente, à época colonial registros singelos, sem maiores regulamentações legais, alguns formalizados segundo Ordenanças Reais, segundo provas que existem desde o século XVI.

Tudo faz crer que o regime legalista tenderá a buscar sempre o seu lugar perante a matéria contábil e até possuir alcance mundial tal como o professor Mahbouli defendeu recentemente (obra identificada na Bibliografia, página 11) perante a Academia de Ciências Econômicas e Financeiras na Espanha, partindo de observações do mercado comum europeu; não obstante a pratica está a demonstrar que os espaços nacionais dificilmente cederão lugar a uma internacionalização em termos absolutos e que as instituições financeiras não amenizarão facilmente a pressão sobre os governos no tangente aos regimes monetaristas que comandam, embora tentativas nesse particular prossigam existindo.

Continuarão sendo obstáculos à tese de uma unificação a realidade do momento mundial manifestada em lesões profundas à Ética, como são guerras, protestos demagógicos, ganância política, mentiras, ditaduras, corrupção, fanatismo religioso e político, a desenfreada e poderosa influência das instituições financeiras e outros aspectos viciosos do comportamento humano perante os mercados; a isso se acrescenta a heterogeneidade de heranças culturais e a dos diferentes poderes militares e econômicos das nações.

O regime legalista de âmbito internacional tem conquistado evolução relativa, a duras penas; veladamente, todavia, as estruturas das instituições que se dizem mundiais continuam, quase todas, sob forte pressão do poderio anglosaxão; a realidade de uma unificação sincera parece ainda carecer de longo caminho a percorrer.

REGIME BURSÁTIL DE INFORMAÇÃO CONTÁBIL

O capitalismo que a partir da era mercantilista muito se fortaleceu foi também o responsável pelo engrandecimento das sociedades comerciais, dando origem à formalização e maior influência daquelas por ações.

A popularização das negociações de participações de capitais, nas quais as partes sequer estavam presentes, mas, sim representadas por intermediários, deu origem às Bolsas de Valores.

Embora as transações envolvendo parcelas de capital fossem já praticadas nas ruas da Roma Antiga, há cerca de 2.000 anos, foi no século XV, quando do Renascimento, que o movimento bursátil começou a situar-se em locais próprios, instalando-se o primeiro em 1497, na cidade de Bruges na Bélgica.

Vultosas somas de dinheiro começaram a girar em tais estabelecimentos, ensejando ao sabor das informações privilegiadas, e, daquelas falsas, grandes lucros e perdas, enriquecendo poucos especuladores e desapontando muitos perdedores.

Nem em todos os países as Bolsas tiveram expansão através das massas, sendo vistas por estas com alguma desconfiança; basta uma comparação, no Brasil, entre a poupança popular e o aplicado em ações para que ainda na atualidade se confirme tal fato.

Em tese a captação de recursos bursáteis para o crescimento econômico é algo relevante e saudável, ensejando formação de riqueza canalizável para grandes empreendimentos, sendo prova disto o que tem ocorrido principalmente nos Estados Unidos da América do Norte, onde o movimento se iniciou no século XVIII; tal tese, entretanto, não merece ainda generalização; assim, por exemplo, uma relação de valores entre o movimento das Bolsas no Brasil e o Produto Interno Bruto é algo que muito desperta a reflexão, permitindo inferir que o desenvolvimento industrial, comercial, não guarda proporcionalidade com o movimento bursátil.

O mercado de capitais deu lucro a uns poucos especuladores, e, também, prejuízos a muita gente, pois, de quando em vez tem sido golpeado em face de irregularidades, envolvendo quebras e manobras desonestas.

São referências negativas, na última década de 70, segundo a imprensa noticiou, fraudes expressivas nos balanços, envolvendo dentre outras a UNITED BRANDS, GULF OIL COMPANY, NORTHROP CORPORATION, AMERICAN AIRLINES, AMERICAN SHIP BUILDING, ASHLAND OIL, BRANIFF AIRWAYS, GOODYEAR TIRE AND RUBER, 3 MS, LOCKHEAD, U.S. STEEL CORPORATION etc.

Recentemente nova onda de escândalos ocorreu com a ENRON, QWEST, MERCK, CISCO, PARMALAT, WORLDCOM, GLOBAL CROSSING, XEROX e dezenas de outras.

O macro desastre financeiro que eclodiu em 2008 é expressiva mazela que arrastou nações a graves situações e influiu diretamente sobre o crescimento econômico, todavia, desde a década de 20 do século XX, os problemas ocorrem (várias foram as crises).

O insucesso de 1929, atribuído em grande parte às demonstrações contábeis, despertou necessidades de regularizações; ficou evidente que as falhas estavam nos informes mal elaborados e falsos.

Em defluência, em 1932, nos Estados Unidos George O. May (ligado a grande empresa de auditoria) recomendou à “New York Stock Exchange” a auditoria baseada em cinco princípios contábeis.

O fato foi relevante por tanger um País de força econômica, embora em realidade os esforços para a uniformização contábil já estivessem em evolução na Europa desde os fins do século XIX.

Foi à busca de maior rigor na evidência das informações sobre as empresas que tinham ações cotadas em Bolsa de Valores que se estimulou um regime de “normas”; o que para os estadunidenses se afigurava como “novo” era, na realidade, procedimento vetusto; a Contabilidade não foi criada pelos anglosaxões, nem se construiu a custa de um pequeno grupo de controladores de normas.

As normalizações atinentes aos procedimentos contábeis relativos aos movimentos do mercado de capitais já eram mais que tricentenárias, tão como os controles por parte do Estado; assim, por exemplo, na França, em decorrência da derrocada do sistema financeiro, foram emitidas as famosas “Ordenanças” de Colbert, no tempo de Luiz XIV (rei de 1643 a 1715) que já eram direcionamentos para a transparência dos balanços.

Melhorar a informação para fins de transações do mercado de capitais foi preocupação, portanto, que de há muito havia sido manifestada e embora o progresso tenha sido lento, evoluiu ao longo do tempo.

Foi o fortalecimento da qualidade do conhecimento contábil que também inspirou estudiosos notáveis como A. Beauchéry em 1865 (autor da obra “Révolution dans na Comptabilité ou Comptabilité de l´avenir”) a pregar uma “unificação geral” através dos Planos de Contas fato que muito contribuiu para uma consciência que fez no início do século XX ocorrer várias padronizações.

Uma corrente de pensadores deu maior destaque ao teor econômico, de controle do Estado (algumas inspiradas nas grandes ditaduras do regime nazista, fascista e socialista), enquanto outra se inspirou no fortalecimento do mundo financeiro e da usura.

Fatos ligados a especulação na área de investimentos, na busca de modelos de influência sobre as práticas contábeis, volvidos ao mercado de capitais, conceituados como “Regime Bursátil de Informação Contábil” foi o que assumiu liderança a partir da década de 60 do século passado, sob a égide de uma autocracia de informação; é esse o que hoje orienta prioritariamente a metodologia das denominadas “Normas Internacionais de Contabilidade”, com interveniências das instituições financeiras (que expressivamente aplicam em Fundos de Investimentos e que influíram nos denominados “Acordos de Basiléia” realizados no século XX).

Não se trata, pois, atualmente de uma “nova Contabilidade”, nem é uma “Revolução” como a pretendia Beauchéry, mas um critério que se alega ser de conveniência e que hoje está sendo adotado para a informação contábil; comanda tal regime pequeno grupo de pessoas: contadores, empresários, especuladores e até não contadores, por se dizerem usuários.

Como um bisturi é simples instrumento para um médico e não a própria Medicina que esse pratica, a informação contábil não vai além de algo instrumental, mas cujo mau uso pode ser fatal financeiramente.

Os grupos que dominam as normatizações contábeis das informações têm sido por vezes duramente acusados e criticados, quer em Parlamentos (como ocorreu no estadunidense e no Brasil, neste através do senador Gabriel Hermes na década de 70, época em que ocorreram as fraudes expressivas já referidas), quer pela imprensa (mereceram até charges pejorativas em 1972 do The New Yorker Magasine); as críticas não cessaram e continuam a ocorrer, especialmente após a crise maiúscula de 2008; também ácidas acusações foram realizadas por muitos intelectuais da Contabilidade desde a década de 70 até recentemente, como as de autores de renome, dentre outros: Moonitz, Briloff, Bernstein, Van Hule, Hendrickson, Breda, Fernandes Ferreira, Carqueja, Koliver, Nepomuceno.

Não obstante a toda a oposição e crises o movimento prossegue, ensejando o aparecimento de entidades particulares abrangentes e intrincado processo de aparência democrática, mas, praticamente hermético, segundo tem a imprensa noticiado.
O regime volvido à informação “Bursátil” terminou por mesclar-se com o “Legalista”, fazendo deste um elo para alcançar força compulsória, utilizando-se de argumentos justificativos como: “convergência de informação”, “harmonização contábil”, “normas não americanas”, “facilidade de investimentos” etc.

Sobre tal situação David M. Katz em comentário recente (identificado na Bibliografia) ensejou a interpretação de que tudo tenha ocorrido nas relações entre Governo e algumas instituições contábeis para consolidar um proveitoso negócio que assegurou privilégio a grupos.

Não obstante, apesar de toda a sofisticação e mutações constantes no campo da produção de Normas, segundo autores de crédito, dentre outros Koller, Goedhart e Wessels (obra identificada na Bibliografia, página 5), o comportamento do mercado de ações na maior bolsa do mundo de 1980 até o presente (os referidos aludiram à situação até a edição da obra em 2005) confundiu e frustrou investidores; tais fatos alegam os referidos intelectuais se materializaram através de bolhas, fraudes contábeis, quebras e outras surpresas desagradáveis.

Os referidos mestres advertiram sobre o fraco rendimento das Bolsas de Valores dos Estados Unidos que em seus altos e baixos períodos, em 200 anos, rendeu aos investidores apenas a modesta taxa de 6,5% (expurgada a taxa de inflação).

Comentaram ainda os ilustres autores referidos sobre as crises agudas de 1929, 1980, 1987, 1990 (página 6 da obra identificada na Bibliografia) referindo-se à gravidade das perdas que a milhões de pessoas atingiram, especialmente em razão de fraudes contábeis nas demonstrações; é possível imaginar o que os censores teriam dito a respeito dos grandes golpes de 2008.

Considerando que o enfoque dos mencionados estudiosos fundamentou-se em dados concretos amplamente demonstrados em sua obra “Valuation” (identificada na Bibliografia) deveras preocupantes são as asserções, especialmente por que se referiram ao mais poderoso mercado de capitais do mundo.

Pode-se bem inferir sobre a relativa valia do “Regime Bursátil de Informação” o afirmado sobre os efeitos das fraudes dos anos 70, objeto de acusações por parte do professor Briloff, da Universidade de New York (obra identificada na Bibliografia) e de Comissão Parlamentar de Inquérito no Senado (obra identificada na Bibliografia), assim como as mazelas ocorridas na atualidade, duramente criticadas; esse o grande risco que a lei 11.638/07 encampou.

Os problemas, todavia, não ocorreram apenas na poderosa nação americana, mas, também, na Europa aonde continuam a suceder em empresas mesmo sob o regime das denominadas IFRSs (Normas ditas Internacionais) como, por exemplo, denuncia recentemente noticia veiculada pela Internet (http://www.cfo.com/ de 14 de março de 2008, artigo de Sarah Johnson identificado na Bibliografia), atingindo importante Banco em caso de fraude não localizada de mais de meio milhão de euros.

Ou seja, tudo o que se tem implantado para “maior clareza”, “fidelidade”, “uniformização”, continua ensejando problemas no campo da infidelidade da informação, cometendo falhas graves no campo da Ética.

Pior em tudo isso no Brasil é que as ditas IRFS (base das normas) expressamente em seus conceitos se colocam acima da lei e esta curiosamente determina que se cumpra o que não se compromete cumprir a lei...

SÍNTESE SOBRE PONTOS RELEVANTES DA INTRODUÇÃO DO REGIME BURSÁTIL DE INFORMAÇÃO NO BRASIL

A partir da década de 60 iniciou-se no Brasil uma intensa movimentação no sentido de reduzir a influência da cultura científica européia, tradicionalmente implantada, dignificada por eminentes líderes como Carlos de Carvalho, João Luiz dos Santos, Francisco D´Áuria, Horácio Berlinck, Frederico Herrmann Júnior, Hilário Franco, Alberto Almada Rodrigues, Armando Aloe, Domingos D´Amore, Henrique Desjardins, Cibilis da Rocha Vianna, Erymá Carneiro, Juvenal Carneiro e tantos outros; não se tratava de um declínio dos europeus e os trabalhos do 6º Congresso da União Européia dos Contadores, Economistas e Financistas realizado em Copenhague em 1969 bem o comprova, mas de uma tomada de espaço liderado pelas grandes firmas de auditoria (na época as oito grandes) no sentido de assumir uma posição de maior controle sobre o já excelente mercado de serviços das mesmas, segundo o Senado dos Estados Unidos publicou em relato específico (identificado na Bibliografia).

O objetivo de estabelecer a prevalência dos padrões de instituições anglosaxônicas sobre as doutrinas científicas da Europa Continental e as próprias brasileiras foi gradativamente se impondo, envolvendo, como assevera Nepomuceno (obra identificada na Bibliografia) um conluio entre grandes empresas, entidades de classe contábil e maiores sociedades de auditores.

Embora se tenha afirmado pela imprensa estar a cultura “americana” em decadência, implantando uma Internacional, na realidade isso não corresponde ao que se pode comprovar a partir de uma simples análise da história da IASB (antes IASC agora pretendendo mais uma vez mudar de nome), entidade particular sediada na Inglaterra, produtora dos ditos IFRSs (Padrões Internacionais de Informações Financeiras).

Na década de 70 o ponto alto da influência referida materializou-se no Brasil na cópia do modelo contábil de instituição estadunidense relativo às demonstrações, inserido na legislação das sociedades por ações (Lei 6404/76).

Até a denominação “contábil” foi substituída por “financeira”, relativamente às peças egressas da escrituração, seguindo ao adotado no idioma inglês.

Não se copiou, entretanto, integralmente uma “Contabilidade americana” como pode parecer, como se fez divulgar, pois, proeminentes autores estadunidenses como William Paton, Roy B. Kester, afeitos às doutrinas científicas, estavam em posição cientifica diferente daquela das entidades de classe; há uma substancial diferença de essência entre Normas Contábeis e Ciência Contábil; normas são procedimentos para escriturar e evidenciar o registrado e ciência contábil é o estudo dos fenômenos patrimoniais dos empreendimentos humanos ao buscarem cumprir os seus propósitos; a norma busca a relatar o que aconteceu e a ciência explica o “porquê” dos acontecimentos; mesmo decorando todas as normas um Contador não terá capacidade de opinar sobre a situação de uma empresa ou determinar quais os caminhos que ela deve seguir no governo da riqueza, pois, isto, só o conhecimento científico enseja.

A meta final do sistema normativo é domínio de informação de acordo com critérios de uma entidade particular, ensejando, todavia debilitação do “Regime Legalista de Informação”, da “Doutrina Científica”, visando tudo substituir por um pragmático “Regime Bursátil de Informação”; tal fato no Brasil se alimentou de muitas decisões emanadas de instituições governamentais e de classe e assim prossegue afoitamente como declarou uma autoridade do Banco Central do Brasil ao “Valor on line” de 25 de setembro de 2009, sugerindo com propriedade o “comedimento”.

Neste início de século XXI, todavia, completou-se no Brasil o curso adrede estabelecido através de resoluções dimanadas da Comissão de Valores Mobiliários e da Lei 11.638/07, esta editada no apagar das luzes do ano de 2007.

Por paradoxal que pareça a Lei foi usada como veículo para enfraquecer o próprio regime por ela inspirado, rompendo com a unicidade da informação contábil.

NORMAS, LEGISLAÇÃO, DOUTRINA CONTÁBIL DO VALOR E REGIME DA INCERTEZA

A referida Lei 11.638/07 que modificou a das sociedades por ações, aderindo ao “Regime Bursátil de Informação”, sem, contudo, abandonar totalmente o “Regime Legalista” (criando um sistema híbrido) trouxe um relevante problema no que tange a expressão de “Valor” nas demonstrações contábeis.

A mescla de critérios de avaliação que foi estabelecida determina o “prevalecer” (para atender a fins legais) e de “não prevalecer” (para atender a fins bursáteis); ensejada ficou a dupla apresentação de valores para as mesmas coisas (modificação decorrente do Artigo 177, §2 da Lei 6404/76, artigo 1º da Lei 11.638/07); ficou ferido o princípio lógico da “não contradição” (uma coisa não pode ser e deixar de ser ao mesmo tempo, segundo o preceito que desde a Lógica de Aristóteles esteve aferrado à tese da “verdade”); isso, contabilmente, atingiu radicalmente a “unicidade” dos informes.

A nova matéria legislada abandonou a “exclusividade” do “Regime Legalista de Informação” até então vigente, para introduzir um “híbrido”, este que sugere como fator significativo o que denomina “Valor Justo” para a quantificação de fatos patrimoniais, ou seja, o de “capacidade de efetivação financeira” (assim está regulado pelas Normas ditas Internacionais, e, embora adotado, todavia, nem sempre respeitado pelas mesmas).

Sobre o referido “Valor Justo” o “Financial Time”, não faz muito tempo, publicou cáustica matéria, atribuindo ao mesmo a condição de “utópico”, acusando aos autores das normas de “ignorantes quanto as doutrinas” dos clássicos, estes que alertam sobre os riscos de tal arbítrio.

A entidade reguladora IASB se viu às voltas com as severas críticas dirigidas à mesma e nos Estados Unidos a matéria transformou-se em objeto de negociação, sob a pressão das instituições financeiras.

Aumentando as interrogações pertinentes a revista brasileira “Valor Econômico” de 06 de março de 2008 veiculou uma expressão deveras preocupante ao afirmar que “Uma nova lei contábil promete deixar os balanços das empresas não financeiras mais voláteis, com efeitos sobre os resultados e por conseqüência distribuição dos dividendos e pagamentos de bônus”.

O denominado “mais volátil” permite entender sobre o que se poderia esperar quanto à aplicação da “liberalidade” na apuração de lucros instituída pela referida Lei 11.638/07, sendo isto motivo de preocupação por parte de quem espera “fidelidade e realidade dos informes”, e, não, o uso de critérios pessoais.

Ficou “indefinido” o conceito veiculado na revista aludida, mas, ensejou supor a adjetivação como algo atribuível a uma janela aberta ao “subjetivo”, ou seja, o não mais rigidamente confinado aos parâmetros legais de natureza tributária (modificação do artigo 177 § 7º, artigo 1º da Lei 11.638/07).

Os referidos “ajustes” expressamente assim identificados no diploma legal referido, ao sabor de “normas”, permitem inferência sobre a “volatilidade” referida, ou seja, a adoção de critérios estabelecidos segundo a vontade de quem produz os dados (assim o Senado dos Estados Unidos permite entender no relato da Comissão de inquérito referida e identificada na Bibliografia aludindo ao movimento normativo).

Como o “subjetivo” opõe-se ao “objetivo”, como este é o científico e aquele o “empírico”, é possível inferir sobre a apologia da prevalência do “particular” sobre o “geral”, ou ainda, o abandono da realidade, esta que é a defendida pela ciência.

Tal fato bem sugere refletir sobre alguns pontos relevantes da doutrina científica contábil do Valor, como deve ser considerada para fins tecnológicos.

ATRIBUIÇÃO DE VALOR E ALEATORIEDADE

O conceito de “valor” em Contabilidade, em si, na essência, fundamenta-se em uma atribuição de “qualidade”; ou seja, deriva-se da relação “necessidade/utilidade”.

Os bens patrimoniais, por natureza, existem para suprir as “necessidades” dos empreendimentos e são estas as que lhes emprestam as “qualidades” cujo caráter, face à “utilidade”, enseja a atribuição de “valor”.

Uma coisa vale pela proficuidade que representa e o patrimônio, em sua essência, como objeto de estudos da Contabilidade, como realidade que é, só se justifica como meio ou matéria proveitosa face à colimação de um escopo definido.

Essa é em tese a “pedra de toque” em uma filosofia do “valor”, como tradicionalmente já era assim tida pelos pensadores estóicos há 2.000 anos.
A mensuração do referido, todavia, é a que oferece o aspecto “quantitativo” ao patrimônio.
Intrinsecamente o que se torna aleatório, pois, não é a atribuição de qualidade, mas, sim, a de quantificação ou mensuração desta.

A determinação quantitativa subordinada à moeda (embora não sendo esta a exclusiva forma de avaliar) se por um lado permite a homogeneização do conjunto patrimonial, por outro se subordina aos efeitos dos tempos e dos espaços e isto é o que produz variações, porque se trata de “medida que também é medível”.

Essa a razão do mestre dos mestres, um dos mais famosos cientistas da Contabilidade do século XX, Gino Zappa, haver afirmado que “a noção de valor, quer da moeda, quer de toda mercadoria, implica sempre conceito de relatividade” (obra referida na Bibliografia, página 208).

O excelso tratadista com fundadas razões lecionou, pois, que a moeda não é medida absoluta de valor, mas, simplesmente a imagem deste em um dado momento (página 207 da obra referida na Bibliografia).

Ou seja, o acessório segue o principal: sendo a moeda instável, o valor que expressa se contamina por essa mesma relatividade e deixa de ser absoluto.

Dezenas de autores modernos como dentre outros Baxter, da London School of Economics, também iniciaram suas melhores obras partindo da tese sobre a “instabilidade da moeda” (Accounting Values and Inflation, identificada na Bibliografia, página 1 e seguintes) defendendo a necessidade de ajustes constantes.

Pacífica se tornou a consciência doutrinária sobre a debilidade do instrumento de medida utilizado em Contabilidade.

Importante, todavia, como substancial suporte de doutrina, foi o reconhecimento sobre a expressiva relação entre a “função das coisas” (utilidade) e a medida delas (valor), alertada nos fins do século XIX pelo ilustre expoente e precursor da Economia Aziendal Giovanni Rossi (obra identificada na Bibliografia).

Não há dúvida, pois, que os bens se mensuram, na essência, cientificamente, por influência “endógena”, pelo valor de “utilidade” e “exógena” pelo que passivamente imprime mutações na riqueza.

Tal tese magnificamente bem desenvolvida por Giovanni Rossi (obra identificada na Bibliografia) é também a que acolhe a moderna doutrina do Neopatrimonialismo Contábil e que bem se aplica na análise das informações para fim de orientação administrativa.

Nas demonstrações, tradicionalmente adotadas, entretanto, como foi visto, a prevalência foi de há muito a do regime da “legalidade”, do “custo histórico”, todavia, considerada a já referida instabilidade da moeda e dos fatores exógenos, a própria lei terminou por realizar concessões (admitindo correções e reavaliações).

Seja como for, entretanto, nenhuma tradução de valor escapou e nem escapa a instabilidade do instrumento preferencial de medida, este que nada tem de absoluto, que também se sujeita a medição.

É inequívoca, pois, a “relatividade do valor monetário” evidenciado, quer pela debilidade da moeda (que por si só já é mutável), quer pela eleição do método adotado na mensuração.

O que se deve buscar, pois, quanto ao tema, é reduzir ao máximo a incerteza que a mensuração possa trazer; contudo, quanto mais critérios se empregarem para avaliar sob óticas de interesses particulares e tanto mais incerto se tornará o demonstrado.
Quando se adota a multiplicidade de aspectos para a avaliação ao sabor de interessados nas atribuições, submete-se o evidenciado ao risco da insegurança.

O correto é buscar minorar diferenças através de recursos de mensuração, inspirados na doutrina (como as referidas sobre o assunto).

Adotar dois ou mais valores para a mesma coisa, em um mesmo momento não é solução técnica, nem científica, mas, ensejo de problema de interpretação.

A prática de apresentar a medida de fenômenos patrimoniais de acordo com a alternativa escolhida pelas partes coloca em risco a expressão da realidade patrimonial.

O fato de uma mesma coisa poder ter várias atribuições de valores, de acordo com o critério agora adotado, rompe com a “unicidade” requerida pela fidelidade informativa e impede que se tenha um referencial confiável.

Não se nega a realidade a respeito dos fatores que influem sobre os critérios de imputação do valor; o que se recusa é a imprecisão em expressá-los.

Inegável é a multiplicidade de fatores que constroem um valor, mas, isto não implica admitir como compulsória a diversidade, sem esforços para encontrar um ponto de equilíbrio.

Na realidade existem avaliações em bases “exógenas” e “endógenas”, mas, estas devem ser convergentes de modo a oferecer a imagem fiel.

O critério de alternativas é o da apologia da imprecisão porque o lógico não admite a contradição quando o requerido é a determinação de realidade objetiva.

Os fatos que influem sobre a formação do valor são muitos, mas, todos identificáveis, mensuráveis e conciliáveis para a apresentação da realidade.

Assim, como influências “exógenas” identificam-se as relativas a: 1) preços vigentes no livre mercado, 2) conveniência comercial entre partes, 3) arbítrios de decisões dos poderes (legislativo, executivo ou judiciário), 4) metas sociais e ambientais etc.

As “endógenas” são as que visam a servir aos interesses da gestão empresarial (de seus organismos volitivos, diretivos e executivos) e aqueles da pesquisa científica.

Tais aspectos variados, constituindo elemento do valor, mesmo de fontes diferentes não devem, todavia, ser motivos para ensejar incertezas, pois, precisam ser considerados sob a relatividade que os envolve; isso quer dizer que mesmo diante de uma multiplicidade de avaliação é preciso que se expliquem as razões da mesma, sem permitir que se perca o aspecto de realidade.

CONSIDERAÇÕES SOBRE O “VALOR JUSTO”

Há quase um século o emérito doutrinador italiano Fábio Besta, no tomo I de sua imortal obra “La Ragioneria” (identificada na Bibliografia, páginas 62, 83, 219 e seguintes, 259 e seguintes do Volume I), lecionou que as avaliações de maior segurança e menos sujeitas a dúvidas são as espelhadas pelo “valor nominal” dos elementos patrimoniais.

Fez o mestre a apologia da determinação monetária, sendo nisso um pioneiro quanto à construção de elementos que poderiam ser tidos como uma autêntica teorização sobre o tema.

Distinguiu, todavia, de forma clara, nas páginas referidas, a diferença entre “valor de contas” de “valor de troca da moeda”, fato que entendeu ensejar distorções, originando eventos que influem sobre a imagem da mensuração.

Defendeu de forma enfática uma adequação de valor, o mais próximo possível de uma realidade a ser medida.

Considerou o valor patrimonial como um complexo formado por elementos, mas, defendeu a unicidade de expressão; isso equivaleu a afirmar que se são apresentados diversos valores para uma coisa, ainda que para cada um se apresente justificativa, deixa-se de apresentar o real ou nominal como preferiu conceituá-lo o grande mestre de mestres.

Um todo se compõe de partes, mas só se define pelo que expressa como conjunto delas; isso equivale a afirmar que as partes podem estar identificadas e se explicarem por si, jamais, todavia, por si só qualificar o global.

Um automóvel se compõe de motor, rodas, eixos, válvulas, estofamento, latarias etc., mas embora todas essas coisas tenham significações e valores próprios são incompetentes para que sejam definidas como se um automóvel fosse, e, sequer, isoladamente atribuir-lhe o preço final.

Como coisas antigas reaparecem ciclicamente sob o manto de “novidades” as teses de Fábio Besta, sob novo rótulo, parecem ter ressurgido nas ditas Normas Internacionais sob a denominação de “Valor Justo”, porém, com sensível pioria; à este se atribuiu o poder de “efetivação real”, aquele que só é válido deveras se a empresa tiver que “liquidar algo” e que nem sempre em todas as normas foi mantido com a coerência esperada.

Assim, por exemplo, um empreendimento não tem, normalmente, seu imobilizado para ser vendido, mas, sim, para ser usado, e, isto, em vez de “valorizar” o patrimônio por uma consideração de “valor de realização”, muito responsabiliza a empresa quanto ao “valor de reposição” ou de compra de novos equipamentos para manter “força produtiva” e a “capacidade competitiva”.

Em tese o problema da aludida “reintegração da perda do capital pelo uso” anula a maior valia de realização de um bem do imobilizado.

O que as referidas normas internacionais, todavia, acolhem e proclamam tendo como base a “prevalência da essência sobre a forma” acaba, também, no caso de “valor de mercado” adotando de certa maneira a “prevalência da forma sobre a essência”, ou seja: o que é válido no formal exógeno pode não ser o que essencialmente é reconhecido em seu efeito endógeno.

Isso porque o externo é, como foi dito, “volátil”, dependendo de como subjetivamente as coisas se evidenciam em um dado momento, ainda que em realidade não sejam o que possam manter durante todos os momentos.

Os fracassos de muitas cotações de Bolsa são deveras expressivos para justificar a realidade referida.

Assim, por exemplo, a seguir-se a norma denominada “internacional” é possível inflar um Balanço com cotações de títulos que podem ser provocadas pela própria empresa interessada (com o uso da mídia), face ao que tem investido em Bolsa, embora o fato não represente a realidade de valor de ações.

O preço de uma aparente realização pode não ser o definitivo e sequer o fiável de forma irretorquível; como os valores no mercado sujeitam-se a fatores nem sempre concretos (desde a década de 70 sobre isso insisti em minha obra “Bolsa de Valores e Valores na Bolsa”, edição APEC) sendo instáveis, se retratados como de “patrimônio”, ensejam a criação de um regime de “incerteza”.

Tal realidade é também entendida por vários autores modernos como James E. Morris (identificada na Bibliografia), Abraham Briloff (identificada na Bibliografia) e outros.
O preço da data do balanço, calculado para um bem, a valor de liquidação, poderá não ser mais o do dia seguinte e nem será possivelmente o de reposição da força produtiva, esta que exigirá desembolso de capital.

Esse o risco que hoje é assumido em defluência de leis” que aceitam uma submissão cultural relativa à informação contábil nas empresas (aferrada que ficou às Normas produzidas por grupos alienígenas).

Ao se consagrar legalmente um regime normativo que sustenta de forma falaz ser o arrendamento mercantil parcela integrante do imobilizado do ativo do arrendatário foge-se ao bom senso; escapa ainda a realidade de forma genérica admitir o valor de realização de bens como parâmetro; se o “leasing” não se pode realizar e se o valor justo é tido como o de realização pelo normatizado, que desordem mental e desrespeito a lógica é esse?

Como aceitar, também, registros firmes de lucros ainda não efetivados, e, outros pontos questionáveis que comprometem a clareza e a realidade?

Tudo isso muito preocupa o desempenho ético do profissional, tão como enseja risco a terceiros.

LEGALIDADE, ESSÊNCIA E FORMA PERANTE A INFORMAÇÃO CONTÁBIL


Entre a legalidade e o tratamento contábil adotado pelo governo após a Lei 11.638/07 existem preocupantes conflitos.

Como hoje, no Brasil, a lei mencionada determina que não se deva cumprir a própria lei (por paradoxal que pareça), porque obriga seguir o que afirma colocar-se acima da lei, torna inquietante o desempenho profissional.

Isso porque se uma lei regula alguma coisa, mas, o normatizado não a adota, prevalece a desobediência porque a própria lei determina que se cumpra a norma denominada como internacional.

Se, todavia, as empresas e os profissionais não seguirem a lei pertinente, perante cada caso específico, poderão ser chamados à responsabilidade por terceiros; ao aplicar, todavia, o que uma lei específica determina estarão a desobedecer à outra lei, ou seja, a que estabelece seja seguido o normatizado para o mercado internacional; erram, pois, por cumprir e por não cumprir a lei.

Caso relevante a ponderar nesse impasse, especialmente, é o relativo à questão da “prevalência da essência sobre a forma dos fatos”, considerando-se o que se deva entender por tais coisas.

A proposição racional sobre a “essência” é milenar e provém de Sócrates (469–399 a.C.) que a ensinou a Platão (428-347 a.C.), este que transferiu saber a Aristóteles (384 a.C. - 322 a.C.), criador da primeira teoria a respeito; avigorou tal análise o neoplatonismo de Plotino (205 - 270 da era cristã) que a elevou até ao mundo do inteligível; o tempo não alterou radicalmente o núcleo da questão, mas, apenas, valorizou aspectos.

Portanto, em sentido lógico, da realidade, “essência” é compreendida cromo a “qualidade do objeto”, ou seja, a da matéria da qual se procura em “lato sensu” determinar ou atribuir o que ela é; ou seja, como no entender de Leibniz aquilo que qualifica a espécie; no caso contábil, em “stricto sensu” a riqueza patrimonial como matéria essencial é vista sob o aspecto de “substância” apta a render utilidade ao empreendimento.

Visões modernas da intelectualidade sobre o tema, como a de Albert Einstein, inclinaram-se para a mesma concepção que em Contabilidade já estava aceita desde o início do século XIX, ou seja, a de que o essencial é o “porquê da própria coisa”.

Há mais de um século foi assim sempre entendida a questão cientificamente, ou seja, do patrimônio como “essência necessária”, dessa maneira ressaltada por Francesco Villa em 1840 e na primeira metade do século XX dentre outros por Vincenzo Masi em sua doutrina científica patrimonial; isso implica estender tal conceito sobre o que “pode ser” e o que pode “não ser” atribuído, tal como foi fixado na teoria einsteiniana.

O Neopatrimonialismo Contábil, todavia, adotando o holismo se situou além das concepções referidas; preferiu comprometer-se com o caráter da essência que Tomás de Aquino (1225-1274) adotou, ou seja, o da abrangência total como visão necessária, essa que envolve também a própria forma, como algo aderente, ampliando-se, mas distinguindo o conceito de “existência”, assumindo como no ‘essencialismo metodológico’ aspectos substanciais como os “funcionais” e “sistemáticos”.

As normas contábeis denominadas internacionais, todavia, adotando a prevalência da essência sobre a forma, já de ha muito consagrada, mas ao feitio dos normatizadores, deixaram de lado a universalidade, imergiram em alternativas, abandonaram critérios científicos e filosóficos, desconheceram formalidades legais e com isso fugiram á realidade.

Em razão do posicionamento empírico referido questões emergiram, ou seja, principalmente as relativas ao direito individual de terceiros.

Perante o fato aludido, questiona-se como ficará o credor no tangente aos ajustes sobre o poder patrimonial da empresa; é interrogação não só a considerar, como, também, algo a refletir sobre o que na crise que ainda se vive está a representar o efeito da informação ao sabor do normatizado; para citar apenas poucos exemplos, suficientes são os casos Madoff e Bañuelos (comentado no jornal Estado de São Paulo de 17/08/2009), ambos envolvendo bilhões de euros.

Não se pode avaliar ainda até que ponto foi e ainda virá a ser a lesão ao investidor minoritário que tem interesse direto no resultado apresentado pela empresa perante perdas ou mesmo lucros manipulados resultantes de ajustes decorrentes da aplicação das regras conhecidas como internacionais.

O entendimento de “essência”, quando “subjetivo”, sendo empírico pode motivar maquiagens em informações e quando tem a apoiá-lo alternativas, essas que as normas referidas são pródigas em oferecer, o que ocorre é pioria; tal fato implica ainda, como agravante, a condição ética.

O científico, todavia, por aferrar-se ao “objetivo”, consagra, sim, a “essência” como condição fundamental para a análise dos fenômenos da riqueza, especialmente como a enfoca e aceita o Neopatrimonialismo Contábil; as normas denominadas como internacionais, entretanto, não se manifestam preocupadas com as conceituações científicas, segundo o que se infere da leitura dos mal redigidos textos das mesmas.

O normatizado não acompanha “lato sensu” os preceitos lógicos aristotélicos, nem os de Aquino, sequer os de Einstein, assim como não segue em “stricto sensu” os clássicos de Villa, Besta, Zappa, Masi e outros expoentes intelectuais da Contabilidade; igualmente muito distante está da moderna doutrina Neopatrimonialista Contábil.

Importante é considerar logicamente que demolido o conceito de “essência”, asfixiado pelo empirismo, falece o antecedente, logo, fenece o consequente como sentido na proposição de “prevalência” sobre a forma e tudo se desorganiza do ponto de vista racional.

O grave erro da normatização internacional, entretanto, não está em adotar a prevalência da essência sobre a forma, mas, sim, como mal trata a questão, desobedecendo a princípios lógicos que sustentam a realidade objetiva, única capaz de apresentar a verdade e garantir a qualidade informativa em Contabilidade.

CONCLUSÔES SOBRE ÉTICA E INFORMAÇÃO PERANTE O MERCADO

A liberdade individual, aquela que Tomás de Aquino proclamou em sua época contra um vetusto sistema, abalou as bases da Ética medieval, cedendo oportunidade para que houvesse avanço em relação ao respeito que aos seres deveria ser atribuído.

As teses originárias do hedonismo, do perfeccionismo, as contribuições relevantes de Bacon, Hobbes, Locke, Spinoza, Bruno, Leibniz, Voltaire, do século XVI ao XVIII sobre os conceitos de direitos do ser humano, contribuíram expressivamente para que algo se adicionasse no sentido de uma consciência ainda mais avançada sobre o tema.
Amadurecida, pois, estava a formação das idéias sobre a liberdade quando a Assembléia das Nações Unidas viria estabelecer em 1948, de forma básica a “Declaração Universal dos Direitos do Homem”, fixando como artigo I que “Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade.” No III que: “Toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.”
E no artigo XIX, ampliando o direito do ser, que: “Toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.”

Consideração especial, todavia, merece o Artigo XXIV ao estabelecer que:

1. Toda pessoa tem deveres para com a comunidade, em que o livre e pleno desenvolvimento de sua personalidade é possível.
2. No exercício de seus direitos e liberdades, toda pessoa estará sujeita apenas às limitações determinadas pela lei, exclusivamente com o fim de assegurar o devido reconhecimento e respeito dos direitos e liberdades de outrem e de satisfazer às justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática.
3. Esses direitos e liberdades não podem, em hipótese alguma, ser exercidos contrariamente aos propósitos e princípios das Nações Unidas.

Inequívoco, pois, é que a liberdade de uma pessoa tem limite e que o maior peso fica com o interesse comunitário naquilo que pertinente for.

Garante-se a liberdade de opinião, de informação, mas, com limites impostos pelos deveres sociais, no que estiver ao alcance de cada um e ao que a lei fixar.

A informação contábil, pois, quando de alcance geral, sobre bens materiais e resultados de empresas que contrariar coletividades (comunidade de acionistas, investidores, credores e terceiros em geral) é eminentemente aética, não excluível o que a lei possa qualificar como pertinente responsabilidade.

Há uma inequívoca transgressão ética perante o mercado o fato de aplicar norma quando por consciência, conhecimento e constatação isso implicar informação alheia à realidade objetiva patrimonial.

A falta de cumprimento de tal “dever ético” perante o mercado, por parte de alguns auditores e contadores, produziu na última década informações falaciosas como as dos ativos e resultados “podres” (lucros não realizáveis e valores não recebíveis ou conversíveis); não são precisos muitos neurônios para entender que se as demonstrações se guiam pelas normas e se estas não impediram a falsidade são elas corresponsáveis pela ocorrência da vultosa crise financeira de 2008 e outros calotes internacionais.

Não foi a ciência contábil a culpada pelo desastre que vitimou expressivamente o mundo econômico, mas, sim as normas incompetentes que não evitaram a falsidade, ainda que para efeitos de mídia, para manter aparência, estivessem sendo implantadas para proteger a “transparência” (que comprovadamente não protegeram como os efeitos da crise evidenciaram).

A lesão a milhares de pessoas e empresas, de muitos trilhões de euros e dólares tem, pois, implicações éticas pessoais profundas perante os mercados e a sociedade.
O domínio da informação manietou aquele que caberia ao campo científico, ético, comprovando a tese de um dos maiores pensadores do século XX, J.F. Lyotard (obra referida na Bibliografia, página 5) de que as guerras futuras serão sempre para fazer prevalecer o poder do império informativo, no qual o da Contabilidade se insere.


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