domingo, 30 de março de 2008

Lei das sociedades, Normas internacionais de contabilidade e “regime da incerteza”

Antônio Lopes de Sá


A Lei 11.638/07 que modificou a das sociedades por ações, aderindo ao “Regime Bursátil de Informação”, sem, contudo, abandonar totalmente o “Regime Legalista” (criando um sistema híbrido) trouxe um relevante problema no que tange a expressão de “Valor” nas demonstrações contábeis.

A mescla de critérios de avaliação que foi estabelecida determina o “prevalecer” (para atender a fins legais) e, também de “não prevalecer” (para atender a fins bursáteis) o sistema de avaliação; ensejada ficou a dupla apresentação de valores para as mesmas coisas (modificação decorrente do Artigo 177, §2 da Lei 6404/76, artigo 1º da Lei 11.638/07).

Ficou ferido o princípio lógico da “não contradição” (uma coisa não pode ser e deixar de ser ao mesmo tempo, segundo o preceito que desde a Lógica de Aristóteles esteve aferrado à tese da “verdade”).

Isso, contabilmente, atingiu radicalmente a “unicidade” dos informes.

A nova matéria legislada abandonou a “exclusividade” do “Regime Legalista de Informação” até então vigente, para introduzir um “híbrido”, este que sugere como fator significativo o que denomina “Valor Justo” para a quantificação de fatos patrimoniais, ou seja, o de “capacidade de efetivação financeira” (assim está regulado pelas Normas ditas Internacionais, e, embora adotado, todavia, nem sempre respeitado pelas mesmas).

O novo critério permite que se faça do balanço um “jogo” como recentemente ocorreu, para citar um só exemplo, com o “Caixa Banco de Investimento”, em Portugal, quando reviu (em baixa) o “Valor Justo” da NOVABASE para 5,6 euros, contra os anteriores 6,80 euros, conforme o DiárioEconômico.com. de 30 de março passado publicou pela Internet (http://www.diarioeconomico.com/edicion/diarioeconomico/nacional/mercados/pt/desarrollo/1072884).

O fato mencionado, em um País de inflação baixa (em janeiro era de 2,6% em relação ao ano anterior), denunciando variação de cerca de 20%, é deveras expressivo como “ajuste”.

Face a tais “ajustes” nos valores dos balanços, nos Estados Unidos, o “Financial Time”, sobre o referido “Valor Justo”, recentemente, publicou cáustica matéria, atribuindo ao mesmo a condição de “utópico”, acusando aos autores das normas de “ignorantes quanto as doutrinas dos clássicos”, estes que alertam sobre os riscos de tal arbítrio.

A entidade reguladora, a IASB está no momento às voltas com retificações sobre a própria matéria por ela mesma regulada, conforme se pode verificar na Internet sobre o assunto (http://www.iasb.org/NR/rdonlyres/8292CE92-0D90-4C8E-80B0-A8D7958D91F2/0/attachment_2_IFRS_5.pdf).

Aumentando as interrogações pertinentes a revista “Valor Econômico” de 06 de março de 2008 veiculou uma expressão deveras preocupante ao afirmar que “Uma nova lei contábil promete deixar os balanços das empresas não financeiras mais voláteis, com efeitos sobre os resultados e por conseqüência distribuição dos dividendos e pagamentos de bônus”.

O denominado “mais volátil” infere entender sobre o que se poderia esperar quanto à aplicação da “liberalidade” na apuração de lucros instituída pela referida Lei 11.638/07, sendo isto motivo de preocupação por parte de quem espera “fidelidade e realidade dos informes”.

Ficou “indefinido” o conceito veiculado na revista aludida, mas, ensejou supor a adjetivação como algo atribuível a uma janela aberta ao “subjetivo”, ou seja, o não mais rigidamente confinado aos parâmetros legais de natureza tributária (modificação do artigo 177 § 7º, artigo 1º da Lei 11.638/07).

Os referidos “ajustes” expressamente assim identificados no diploma legal referido, ao sabor de “normas”, permitem a inferência sobre a “volatilidade” referida, ou seja, a adoção de critérios estabelecidos segundo a vontade de quem produz os dados (assim o Senado dos Estados Unidos permite entender no relato da Comissão de inquérito referida e identificada na Bibliografia aludindo ao movimento normativo).

Como o “subjetivo” opõe-se ao “objetivo”, como este é o científico e aquele o “empírico”, é possível inferir sobre a apologia da prevalência do “particular” sobre o “geral”, ou ainda, o abandono da realidade, esta que é a defendida pela ciência.

Tal fato bem sugere refletir sobre alguns pontos relevantes da doutrina científica do Valor, como esta deve ser tecnicamente considerada e, também, quanto em risco a nova lei brasileira colocou os usuários de informações ao submeter a Contabilidade nacional a normas alienígenas ensejando, pois, um “Regime da Incerteza”.

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