Antônio Lopes de Sá
A revista “CFO.com”, de New York, há dias divulgou, sob a responsabilidade de David Katz, matéria abordando o denominado “Valor Justo”.
Comentou que o movimento Normativo contábil não se ajustou ainda e que só em 2010 se espera uma solução para um conflito conceitual de base.
A mesma revista, todavia, tem artigos que evidenciam que os “Princípios Geralmente Aceitos” estão se despedindo para implantação do que se denomina como “IRFS”, mas que ainda não existe segurança nem um consenso firme (artigos de Rappeport e Johnson referidos na Bibliografia).
Entrementes, no Brasil, já consagrado pela Lei 11.638/07 e pelas Resoluções do Conselho Federal de Contabilidade o assunto é tido como pacífico, embora, na realidade, contestável e hibrido em certos aspectos como por exemplo quando na lei e normas se adotam como sinônimos (que não são), as nomenclaturas “Princípios Geralmente Aceitos”, “IRFSs” e “Normas Internacionais”.
Na realidade a “convergência” em tese, pelo que se tem noticiado, está ainda a gerar dúvidas e até conflitos entre os entendimentos das duas mais influentes entidades mundiais (IASB e FASB); permanece o referido sem uma definição inquestionável; deixa em sérias dúvidas e incertezas um dos temas de maior expressão e que é o do “Valor”.
Parece conservar esquecido que o conceito de “Valor” em Contabilidade, em si, na essência, fundamenta-se em uma atribuição de “qualidade”; ou seja, derivada da relação: “necessidade/utilidade”.
Embora a doutrina científica lecione que os bens patrimoniais, por natureza, existem para suprir as “necessidades” dos empreendimentos humanos, o tema vai sendo procrastinado e só se acenam soluções para 2010.
Parece anestesiado e entendimento de que são as necessidades as que emprestam as “qualidades” cujo caráter, face à “utilidade” enseja a atribuição de “valor”.
Na realidade coisa alguma vale por si mesmo, mas, sim, em função do que se lhe atribui de valor.
Uma coisa é valiosa pela proficuidade que representa.
Essa é em tese uma filosofia do “valor”, como tradicionalmente já era assim tida pelos pensadores estóicos há 2.000 anos, como foi sustentada pelos clássicos da Economia e da Contabilidade, mesmo sendo diferentes as metodologias nessas duas ciências.
O patrimônio, todavia, em sua essência, como objeto de estudos da Contabilidade, só se justifica como meio ou matéria proveitosa face à colimação de um escopo definido, requerendo observação “objetiva”.
É a “mensuração” do valor a que oferece o aspecto “quantitativo” à riqueza patrimonial.
Na essência o que se torna aleatório, pois, não é a atribuição de “qualidade”, mas, sim, a de “quantificação” ou “mensuração” desta.
Todavia, a determinação “quantitativa” subordinada à moeda (embora não sendo esta a exclusiva forma de avaliar) se por um lado permite a homogeneização do conjunto patrimonial, por outro se subordina aos efeitos dos tempos e dos espaços e isto é o que produz variações, porque se trata de “medida que também é medível”.
Essa a razão do mestre dos mestres, um dos mais famosos cientistas da Contabilidade do século XX, Gino Zappa, haver insistido em que “a noção de valor, quer da moeda, quer de toda mercadoria, implica sempre conceito de relatividade” (obra referida na Bibliografia, página 208).
O excelso tratadista com fundadas razões afirmou que a moeda não é medida absoluta de valor, mas, simplesmente a imagem deste em um dado momento (página 207 da obra referida na Bibliografia).
Destacou que o acessório segue o principal, ou ainda, que sendo a moeda instável, o valor que expressa se contamina por essa mesma relatividade e deixa de ser absoluto, ensejando riscos na mensuração.
Inúmeros autores modernos como dentre outros Baxter, da “London School of Economics”, também fundamentaram suas melhores obras partindo da mesma tese da “instabilidade da moeda” (Accounting Values and Inflation, identificada na Bibliografia, página 1 e seguintes), defendendo a necessidade de atualizações constantes.
Pacífica se tornou a consciência doutrinária sobre a debilidade do instrumento de medida utilizado em Contabilidade, recusando critérios “voláteis”, requerendo os estribados na ciência.
Importante, como substancial suporte de doutrina, foi o reconhecimento sobre a expressiva relação entre a “função das coisas” (utilidade) e a medida delas (valor), alertada nos fins do século XIX pelo ilustre expoente e precursor da Economia Aziendal Giovanni Rossi (obra identificada na Bibliografia), um dos precursores dos postulados que ensejaram uma “Teoria do Valor” sob o prisma contábil.
Os bens se mensuram, na essência, cientificamente, por influência “endógena”, pelo poder de “utilidade”, e, “exógena”, pelo que passivamente é impresso de mutação sobre a riqueza.
Tal tese magnificamente bem desenvolvida por Rossi foi também a que se tornou acolhida pela moderna doutrina como a de Baxter (obra identificada na Bibliografia).
Nas demonstrações, tradicionalmente adotadas, entretanto, a prevalência foi de há muito a do regime da “legalidade”, do “custo histórico”, mas, considerada a já referida instabilidade da moeda e dos fatores exógenos, a própria lei terminou por realizar concessões (admitindo correções e reavaliações).
Seja como for, entretanto, nenhuma tradução de valor escapou e nem escapa a instabilidade do instrumento preferencial de medida, este que nada tem de absoluto, que também se sujeita a medição.
É inequívoca, pois, a “relatividade do valor monetário” evidenciado, quer pela debilidade da moeda (que por si só já é mutável), quer pela eleição do método adotado na mensuração.
O que se deve buscar, pois, quanto ao tema, é reduzir ao máximo a “incerteza” que a mensuração possa trazer; contudo, quanto mais critérios se empregarem para avaliar sob óticas de interesses particulares e tanto mais incerto se tornará o demonstrado.
Quando se adota a multiplicidade de aspectos para a avaliação ao sabor de poucos interessados nas atribuições, submete-se o evidenciado ao risco da insegurança quanto ao aspecto geral.
Avaliações, em matéria contábil, para serem justas devem ser “objetivas” evitando o “aleatório”.
O critério de alternativas é o da apologia da imprecisão porque o lógico não admite a contradição (uma coisa não pode ser e deixar de ser ao mesmo tempo) e muito menos o impreciso.
BIBLIOGRAFIA
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